Márcio Luiz Soares
quinta-feira, 31 de dezembro de 2009
Acredite em você
Nunca duvide, nunca deixe de acreditar, na sua capacidade de realizar seus sonhos.
Márcio Luiz Soares
Provavelmente você não vai realizar todos no próximo ano, mas com convicção e esforço, conquistará o que deseja nos anos seguintes. E se mesmo assim, caso não obtenha algum sucesso com um ou outro desejo ao longo da vida, contente-se com o que possuir até então. A satisfação pelo que conseguiu lhe fará sentir o gosto da vitória e ninguém melhor que você saberá o quanto valeu a pena lutar.
No entanto, apesar de tudo, nunca pare de sonhar, de desejar algo melhor em tua vida. A busca do desejo é um fator determinante da evolução humana e até mesmo quando ficamos insatisfeitos por algo não obtido, serve de alavanca para a busca de uma nova conquista, causando uma evolução em nós mesmos. Faz parte do ciclo da vida de cada um de nós.
Tenha um ótimo, sensacional, espetacular e feliz, claro, 2010!
Márcio Luiz Soares
* * *
Arte: André Sanches
Clique na imagem para ver em tamanho maior.
segunda-feira, 28 de dezembro de 2009
Receita de Ano Novo
Para você ganhar belíssimo Ano Novo
cor de arco-íris, ou da cor da sua paz,
Ano Novo sem comparação como todo o tempo já vivido
(mal vivido ou talvez sem sentido)
para você ganhar um ano
não apenas pintado de novo, remendado às carreiras
mas novo nas sementinhas do vir-a-ser,
novo
até no coração das coisas menos percebidas
(a começar pelo seu interior)
novo espontâneo, que de tão perfeito nem se nota,
mas com ele se come, se passeia,
se ama, se compreende, se trabalha,
você não precisa beber champanha ou qualquer outra birita,
não precisa expedir nem receber mensagens
(planta recebe mensagens?
passa telegramas?).
Não precisa fazer lista de boas intenções
para arquivá-las na gaveta.
Não precisa chorar de arrependido
pelas besteiras consumidas
nem parvamente acreditar
que por decreto da esperança
a partir de janeiro as coisas mudem
e seja tudo claridade, recompensa,
justiça entre homens e as nações,
liberdade com cheiro e gosto de pão matinal,
direitos respeitados, começando
pelo direito augusto de viver.
Para ganhar um ano novo
que mereça este nome,
você, meu caro, tem de merecê-lo,
tem de fazê-lo de novo, eu sei que não é fácil,
mas tente, experimente, consciente.
É dentro de você que o Ano Novo
cochila e espera desde sempre.
Carlos Drummond de Andrade
segunda-feira, 21 de dezembro de 2009
Fakes
Na semana passada, dei de presente para minha amiga Erika Rolim um livro de crônicas do Arnaldo Jabor. Enquanto comprava, lembrei de um texto dele que eu li recentemente num jornal. E voltei a lembrar hoje, após receber uma mensagem com um texto que acham que é do Arnaldo Jabor, mas que não é. O texto do Jabor que mencionei é justamente sobre os textos que estão sendo espalhados todos os dias pela internet como sendo dele e que na verdade não são - e o artigo da mensagem que recebi também foi comentado – além de perfis falsos em diversas comunidades. Decidi reproduzir a crônica por aqui numa tentativa de colaborar na divulgação, já que muita gente nem deve saber dessa publicação feita nos jornais em que ele é cronista.
* * *
Blogs, Twitter, Orkut e outros buracos
.
Existe um “sub-eu” vagando na internet
Não estou no “twitter”, não sei o que é o “twitter”, jamais entrarei neste terreno baldio e, incrivelmente, tenho 26 mil “seguidores” no “twitter”. Quem me pôs lá? Quem foi o canalha que usou meu nome? Jamais saberei. Vivemos no poço escuro da web. Ou buscamos a exposição total para ser “celebridade” ou usamos esse anonimato irresponsável com nome dos outros. Tem gente que fala para mim: “Faz um blog, faz um blog!” Logo eu, que já sou um blog vivo, tagarelando na TV, rádio e jornais... Jamais farei um blog, este nome que parece um coaxar de sapo boi. Quero o passado. Quero o lápis na orelha do quitandeiro, quero o gato do armazém dormindo no saco de batatas, quero o telefone preto, de disco, que não dá linha, em vez dos gemidinhos dos celulares incessantes.
Comunicar o quê? Ninguém tem nada a dizer... Olho as opiniões, as discussões “on-line” e só vejo besteira, frases de 140 caracteres para nada dizer. Vivemos a grande invasão dos lugares-comuns, dos uivos de medíocres ecoando asnices para ocultar sua solidão deprimente. O que espanta é a velocidade da luz para a lentidão dos pensamentos, uma movimentação “em rede” para raciocínios lineares. A boa e velha burrice continua intocada, agora disfarçada pelo charme da rapidez. Antigamente os burros eram humildes; se esgueiravam pelos cantos, ouvindo, amargurados, os inteligentes deitando falação. Agora não; é a revolução dos idiotas on-line.
Quero sossego, mas querem me expandir, esticar meus braços em tentáculos digitais, meus olhos no “Google”, (“goggles” — olhos arregalados) em órbitas giratórias, querem que eu seja ubíquo, quando desejo caminhar na condição de pobre bicho bípede; não quero tudo saber, ao contrário, quero esquecer; sinto que estão criando desejos que não tenho, fomes que perdi. Estamos virando aparelhos; os homens andam como robôs, falam como microfones, ouvem como celulares, não sabemos se estamos com tesão ou se criam o tesão em nós. O Brasil está tonto, perdido entre tecnologias novas cercadas de miséria e estupidez por todos os lados. A tecno-ciência nos enfiou uma lógica produtiva de fábricas vivas, chips, pílulas para tudo, enquanto a barbárie mais vagabunda corre solta no País, balas perdidas, jaquetas e tênis roubados, com a falsa esquerda sendo pautada pela mais sinistra direita que já tivemos, com o Jucá e o Calheiros botando o Chávez no Mercosul para “talibanizar” de vez a América Latina. Temos de “funcionar” — não de viver. Somos carros, somos celulares, somos circuitos sem pausa. Assistimos a chacinas diárias do tráfico entre chips e “websites”.
Escritores Fantasmas
O leitor perguntará: “Por que este ódio todo, bom Jabor?” Claro que acho a revolução digital a coisa mais importante dos séculos. Mas, estou com raiva por causa dos textos apócrifos que continuam enfiando na internet com meu nome.
Já reclamei aqui desses textos, mas tenho de me repetir. Todo dia surge uma nova besteira, com dezenas de emails me elogiando pelo que eu “não” fiz. Vou indo pela rua e três senhoras me abordam — “Teu artigo na internet é genial! Principalmente quando você escreve: ‘As mulheres são tão cheirosinhas; elas fazem biquinho e deitam no teu ombro...’”
“Não fui eu...”, respondo. Elas não ouvem e continuam: “Modéstia sua! Finalmente alguém diz a verdade sobre as mulheres! Mandei isso para mil amigas! Adoraram aquela parte: ‘Tenho horror à mulher perfeitinha. Acho ótimo celulite...’” Repito que não é meu, mas elas (em geral barangas) replicam: “Ah... É teu melhor texto...” — e vão embora, rebolando, felizes.
Sei que a internet democratiza, dando acesso a todos para se expressar. Mas a democracia também libera a idiotia. Deviam inventar um “anti-spam” para bobagens.
Vejam mais o que “eu” escrevi: “As mulheres de hoje lutam para ser magrinhas. Elas têm horror de qualquer carninha saindo da calça de cintura tão baixa que o cós acaba!”... Luto dia e noite contra cacófatos e jamais escreveria “cós acaba!” Mas, para todos os efeitos, fui eu. Na internet eu sou amado como uma besta quadrada, um forte asno... (dirão meus inimigos: “Finalmente, ele se encontrou...”)
Vejam as banalidades que me atribuem:
“Bom mesmo é ter problema na cabeça, sorriso na boca e paz no coração!”
Ou: “A vida é uma peça de teatro que não permite ensaios. Por isso cante, chore, dance e viva intensamente antes que a cortina se feche!”
Ainda sobre a mulher: “São escravas aparentemente alforriadas numa grande senzala sem grades.”
Há um texto bem gay sobre os gaúchos, há mais de um ano. Fui “eu”, a mula virtual, quem escreveu tudo isso. E não adianta desmentir.
Esta semana descobri mais. Há um texto rolando (e sendo elogiado) sobre “ninguém ama uma pessoa pelas qualidades que ela tem” ou outro em que louvo a estupidez, chamado Seja Idiota!...
Mas o pior são artigos escritos por inimigos covardes para me sujar. Há um texto de extrema direita, boçal, xingando os brasileiros, onde há coisas como: “Brasileiro é babaca. Elege para o cargo mais importante do Estado um sujeito que não tem escolaridade e preparo nem para ser gari. Brasileiro é um povo trabalhador. Mentira. Brasileiro é vagabundo por excelência. Um povo que se conforma em receber uma esmola do governo de 90 reais mensais para não fazer nada, não pode ser adjetivado de outra coisa que não de vagabundo. 90% de quem vive na favela é gente honesta e trabalhadora. Mentira. Muito pai de família sonha que o filho seja aceito como ‘aviãozinho’ do tráfico para ganhar uma grana legal. Se a maioria da favela fosnuam enfiando na ise honesta, já teriam existido condições de se tocar os bandidos de lá para fora... O brasileiro merece! É igual a mulher de malandro — gosta de apanhar ...”
E o pior é que muita gente me cumprimenta pela “coragem” de ter escrito esta sordidez.
Ou seja: admiram-me pelo que eu teria de pior; sou amado pelo que não escrevi. Na internet, eu sou machista, gay, idiota, corno e fascista. É bonito isso?
Não estou no “twitter”, não sei o que é o “twitter”, jamais entrarei neste terreno baldio e, incrivelmente, tenho 26 mil “seguidores” no “twitter”. Quem me pôs lá? Quem foi o canalha que usou meu nome? Jamais saberei. Vivemos no poço escuro da web. Ou buscamos a exposição total para ser “celebridade” ou usamos esse anonimato irresponsável com nome dos outros. Tem gente que fala para mim: “Faz um blog, faz um blog!” Logo eu, que já sou um blog vivo, tagarelando na TV, rádio e jornais... Jamais farei um blog, este nome que parece um coaxar de sapo boi. Quero o passado. Quero o lápis na orelha do quitandeiro, quero o gato do armazém dormindo no saco de batatas, quero o telefone preto, de disco, que não dá linha, em vez dos gemidinhos dos celulares incessantes.
Comunicar o quê? Ninguém tem nada a dizer... Olho as opiniões, as discussões “on-line” e só vejo besteira, frases de 140 caracteres para nada dizer. Vivemos a grande invasão dos lugares-comuns, dos uivos de medíocres ecoando asnices para ocultar sua solidão deprimente. O que espanta é a velocidade da luz para a lentidão dos pensamentos, uma movimentação “em rede” para raciocínios lineares. A boa e velha burrice continua intocada, agora disfarçada pelo charme da rapidez. Antigamente os burros eram humildes; se esgueiravam pelos cantos, ouvindo, amargurados, os inteligentes deitando falação. Agora não; é a revolução dos idiotas on-line.
Quero sossego, mas querem me expandir, esticar meus braços em tentáculos digitais, meus olhos no “Google”, (“goggles” — olhos arregalados) em órbitas giratórias, querem que eu seja ubíquo, quando desejo caminhar na condição de pobre bicho bípede; não quero tudo saber, ao contrário, quero esquecer; sinto que estão criando desejos que não tenho, fomes que perdi. Estamos virando aparelhos; os homens andam como robôs, falam como microfones, ouvem como celulares, não sabemos se estamos com tesão ou se criam o tesão em nós. O Brasil está tonto, perdido entre tecnologias novas cercadas de miséria e estupidez por todos os lados. A tecno-ciência nos enfiou uma lógica produtiva de fábricas vivas, chips, pílulas para tudo, enquanto a barbárie mais vagabunda corre solta no País, balas perdidas, jaquetas e tênis roubados, com a falsa esquerda sendo pautada pela mais sinistra direita que já tivemos, com o Jucá e o Calheiros botando o Chávez no Mercosul para “talibanizar” de vez a América Latina. Temos de “funcionar” — não de viver. Somos carros, somos celulares, somos circuitos sem pausa. Assistimos a chacinas diárias do tráfico entre chips e “websites”.
Escritores Fantasmas
O leitor perguntará: “Por que este ódio todo, bom Jabor?” Claro que acho a revolução digital a coisa mais importante dos séculos. Mas, estou com raiva por causa dos textos apócrifos que continuam enfiando na internet com meu nome.
Já reclamei aqui desses textos, mas tenho de me repetir. Todo dia surge uma nova besteira, com dezenas de emails me elogiando pelo que eu “não” fiz. Vou indo pela rua e três senhoras me abordam — “Teu artigo na internet é genial! Principalmente quando você escreve: ‘As mulheres são tão cheirosinhas; elas fazem biquinho e deitam no teu ombro...’”
“Não fui eu...”, respondo. Elas não ouvem e continuam: “Modéstia sua! Finalmente alguém diz a verdade sobre as mulheres! Mandei isso para mil amigas! Adoraram aquela parte: ‘Tenho horror à mulher perfeitinha. Acho ótimo celulite...’” Repito que não é meu, mas elas (em geral barangas) replicam: “Ah... É teu melhor texto...” — e vão embora, rebolando, felizes.
Sei que a internet democratiza, dando acesso a todos para se expressar. Mas a democracia também libera a idiotia. Deviam inventar um “anti-spam” para bobagens.
Vejam mais o que “eu” escrevi: “As mulheres de hoje lutam para ser magrinhas. Elas têm horror de qualquer carninha saindo da calça de cintura tão baixa que o cós acaba!”... Luto dia e noite contra cacófatos e jamais escreveria “cós acaba!” Mas, para todos os efeitos, fui eu. Na internet eu sou amado como uma besta quadrada, um forte asno... (dirão meus inimigos: “Finalmente, ele se encontrou...”)
Vejam as banalidades que me atribuem:
“Bom mesmo é ter problema na cabeça, sorriso na boca e paz no coração!”
Ou: “A vida é uma peça de teatro que não permite ensaios. Por isso cante, chore, dance e viva intensamente antes que a cortina se feche!”
Ainda sobre a mulher: “São escravas aparentemente alforriadas numa grande senzala sem grades.”
Há um texto bem gay sobre os gaúchos, há mais de um ano. Fui “eu”, a mula virtual, quem escreveu tudo isso. E não adianta desmentir.
Esta semana descobri mais. Há um texto rolando (e sendo elogiado) sobre “ninguém ama uma pessoa pelas qualidades que ela tem” ou outro em que louvo a estupidez, chamado Seja Idiota!...
Mas o pior são artigos escritos por inimigos covardes para me sujar. Há um texto de extrema direita, boçal, xingando os brasileiros, onde há coisas como: “Brasileiro é babaca. Elege para o cargo mais importante do Estado um sujeito que não tem escolaridade e preparo nem para ser gari. Brasileiro é um povo trabalhador. Mentira. Brasileiro é vagabundo por excelência. Um povo que se conforma em receber uma esmola do governo de 90 reais mensais para não fazer nada, não pode ser adjetivado de outra coisa que não de vagabundo. 90% de quem vive na favela é gente honesta e trabalhadora. Mentira. Muito pai de família sonha que o filho seja aceito como ‘aviãozinho’ do tráfico para ganhar uma grana legal. Se a maioria da favela fosnuam enfiando na ise honesta, já teriam existido condições de se tocar os bandidos de lá para fora... O brasileiro merece! É igual a mulher de malandro — gosta de apanhar ...”
E o pior é que muita gente me cumprimenta pela “coragem” de ter escrito esta sordidez.
Ou seja: admiram-me pelo que eu teria de pior; sou amado pelo que não escrevi. Na internet, eu sou machista, gay, idiota, corno e fascista. É bonito isso?
Arnaldo Jabor é escritor, jornalista e cineasta
* * *
Texto extraído do Jornal Correio Popular, de 3/11/2009, Campinas/SP
Foto de: The Smoking Gun (site)
Foto de: The Smoking Gun (site)
sábado, 12 de dezembro de 2009
O meu dezembro
Finalmente estou postando em dezembro. Este mês que eu não via a hora de chegar! Pois ele traz consigo o encerramento de um ciclo, entre tantos outros que permeiam as nossas vidas.
Foi um mês muito desejado por mim, devido a tudo que passei nos últimos meses. Infelizmente, coisas desagradáveis estão acontecendo, que influenciará irreparavelmente o meu futuro. Portanto, mais um motivo para eu criar uma espécie de meditação especial:
Que meu dezembro seja tranquilo e, caso não seja, que ao menos não esbarre em nenhum pingo da turbulência dos meses anteriores. Que ele também seja de paz. E que se não for totalmente, que ao menos acalente meu coração, me oferecendo o reencontro de amigos queridos e de familiares de ontem e de hoje. Que me faça agir da maneira que mais gosto: com simplicidade.
Que este meu querido dezembro feche mais um ciclo, mas que antes disso abra a minha mente para o que se aproxima e para o que se foi. Que ilumine a minha nova estrada. Que não me tome a chave da porta da realidade nua e crua. Que não leve a chave do portão da fantasia - que nunca vai me largar mesmo.
Que o meu maravilhoso dezembro deste ano me faça lembrar dos dezembros dos outros. Que me faça sorrir pelos outros dezembros que virão. Que me faça sorrir o tempo todo, nem que seja no recôndito do meu ser ou nas profundezas da minha inefável solidão.
Que meu dezembro de agora me dê de presente a mim mesmo. Que traga um verão de alegria. Que acaricie meus sonhos. Que lance um dedo de prosa com Deus. Que limpe meu coração da dor da perda. Que encha de flores alegres o meu jardim de objetivos. Que traga flores com espinhos também. Que me traga um pouco de tristeza (é inevitável mesmo...) - para que me ofereça mais momentos de felicidade. E que não sejam apenas os “meus” momentos, mas que me lembrem de ir atrás deles.
Que meu dezembro continue a ser o que sempre foi para mim e o que sempre será: um mês de reflexão; da busca do que deixei para trás e do que desejo; além da busca da fé, tendo sempre a esperança de que um mundo melhor se aproxima.
Enfim, que o meu dezembro não seja melhor nem pior que de ninguém. Mas que ele seja único.
Que meu dezembro seja tranquilo e, caso não seja, que ao menos não esbarre em nenhum pingo da turbulência dos meses anteriores. Que ele também seja de paz. E que se não for totalmente, que ao menos acalente meu coração, me oferecendo o reencontro de amigos queridos e de familiares de ontem e de hoje. Que me faça agir da maneira que mais gosto: com simplicidade.
Que este meu querido dezembro feche mais um ciclo, mas que antes disso abra a minha mente para o que se aproxima e para o que se foi. Que ilumine a minha nova estrada. Que não me tome a chave da porta da realidade nua e crua. Que não leve a chave do portão da fantasia - que nunca vai me largar mesmo.
Que o meu maravilhoso dezembro deste ano me faça lembrar dos dezembros dos outros. Que me faça sorrir pelos outros dezembros que virão. Que me faça sorrir o tempo todo, nem que seja no recôndito do meu ser ou nas profundezas da minha inefável solidão.
Que meu dezembro de agora me dê de presente a mim mesmo. Que traga um verão de alegria. Que acaricie meus sonhos. Que lance um dedo de prosa com Deus. Que limpe meu coração da dor da perda. Que encha de flores alegres o meu jardim de objetivos. Que traga flores com espinhos também. Que me traga um pouco de tristeza (é inevitável mesmo...) - para que me ofereça mais momentos de felicidade. E que não sejam apenas os “meus” momentos, mas que me lembrem de ir atrás deles.
Que meu dezembro continue a ser o que sempre foi para mim e o que sempre será: um mês de reflexão; da busca do que deixei para trás e do que desejo; além da busca da fé, tendo sempre a esperança de que um mundo melhor se aproxima.
Enfim, que o meu dezembro não seja melhor nem pior que de ninguém. Mas que ele seja único.
* * *
Como de praxe, segue o clipe do mês. Ou clipes. A canção é muito bonita, dona de uma letra interessante e interpretada com muita expressividade pelo vocalista. Bom, Linkin Park dispensa comentários, certo? Você escolhe qual quer ver e ouvir: o primeiro clipe, ao vivo com legendas em português ou o segundo, versão de internauta, da gravação de estúdio, maior, com o som muito melhor e com legendas em inglês.
Quer saber? Veja os dois e aproveita pra refletir sobre este ano. Nos dias que te trouxeram alegrias, tristezas, dores, planos, sonhos, muita emoção, talvez alguns sacrifícios, amizade, amor. Enfim, na vida.
Como de praxe, segue o clipe do mês. Ou clipes. A canção é muito bonita, dona de uma letra interessante e interpretada com muita expressividade pelo vocalista. Bom, Linkin Park dispensa comentários, certo? Você escolhe qual quer ver e ouvir: o primeiro clipe, ao vivo com legendas em português ou o segundo, versão de internauta, da gravação de estúdio, maior, com o som muito melhor e com legendas em inglês.
Quer saber? Veja os dois e aproveita pra refletir sobre este ano. Nos dias que te trouxeram alegrias, tristezas, dores, planos, sonhos, muita emoção, talvez alguns sacrifícios, amizade, amor. Enfim, na vida.
segunda-feira, 30 de novembro de 2009
domingo, 29 de novembro de 2009
Parte de mim
O que a luz me privou
A escuridão me ensinou
Assim
Custei enxergar no intervalo dos sonhos
A parte do meu mundo que se desfez
Não fosse a barreira da luz
A insensatez teria invadido
O resto que ficou
A escuridão me ensinou
Assim
Custei enxergar no intervalo dos sonhos
A parte do meu mundo que se desfez
Não fosse a barreira da luz
A insensatez teria invadido
O resto que ficou
Não fosse o trajeto da escuridão
O que ficou não teria fim
Enfim
Tudo passa
E tudo não passa
De parte de mim
Não é a melhor parte
Mas faz parte de mim
Márcio Luiz Soares
* * *
Resolvi abrir, outra vez, uma frestinha da gaveta.
sábado, 28 de novembro de 2009
Abrir(-se)
sexta-feira, 27 de novembro de 2009
Qualquer dia desses
Qualquer dia desses
Mudo meu jeito de viver
Dispo-me das regras sociais
Fico rebelde, enlouqueço.
Qualquer dia desses
Conto piadas bem fortes
Ando descalça na rua
Tiro até minhas roupas
Posso até ficar nua.
Qualquer dia desses
Trepo em uma árvore bem alta
Se cair não faço falta
E como frutas fresquinhas.
Qualquer dia desses
Volto a viver a vida
Encontros em qualquer esquina
Até encontrar a saída.
Qualquer dia desses
Subo no coreto da praça
Declamo um poema do Neruda
Quem sabe isso ajuda.
Que seja um poema de amor
Pra espantar dessa cidade
Essa onda de horror
Dos menores de idade.
Qualquer dia desses
Viro “adulta” de rua
E durmo nas calçadas, nos guetos
Sentindo a realidade nua e crua.
Qualquer dia desses
Canto um tango
Danço samba
Bolero, funk de rua
Sentindo de perto o calor humano
Cantando versos pra lua.
Sue Nery
Mudo meu jeito de viver
Dispo-me das regras sociais
Fico rebelde, enlouqueço.
Qualquer dia desses
Conto piadas bem fortes
Ando descalça na rua
Tiro até minhas roupas
Posso até ficar nua.
Qualquer dia desses
Trepo em uma árvore bem alta
Se cair não faço falta
E como frutas fresquinhas.
Qualquer dia desses
Volto a viver a vida
Encontros em qualquer esquina
Até encontrar a saída.
Qualquer dia desses
Subo no coreto da praça
Declamo um poema do Neruda
Quem sabe isso ajuda.
Que seja um poema de amor
Pra espantar dessa cidade
Essa onda de horror
Dos menores de idade.
Qualquer dia desses
Viro “adulta” de rua
E durmo nas calçadas, nos guetos
Sentindo a realidade nua e crua.
Qualquer dia desses
Canto um tango
Danço samba
Bolero, funk de rua
Sentindo de perto o calor humano
Cantando versos pra lua.
Sue Nery
* * *
Valeu, Sue. Brigadão.
Márcio.
Márcio.
quinta-feira, 26 de novembro de 2009
O sucesso é cego
Quando uma pessoa está perdidamente apaixonada, só tem olhos para o amor, só enxerga as qualidades e virtudes do ser amado, é tudo lindo e maravilhoso. Não é capaz de perceber fraquezas, defeitos nem contradições de seu adorado, pois, como diz o velho ditado, “o amor é cego”.
O sucesso também é cego, sabia? É natural que, quando a carreira deslancha e tudo dá certo, um sentimento de empolgação tome conta de nós. O problema é que podemos ficar cada vez mais focados em nossos objetivos e motivados para novas conquistas; passamos a só ter olhos para o sucesso e deixamos de enxergar coisas importantes na vida.
Deixamos de enxergar os outros, por exemplo. O sucesso pode nos dar a (falsa) ideia de que somos autosuficientes, poderosos, capazes de fazer tudo sozinhos – logo, não precisamos de conselhos, sugestões, opiniões e muito menos ajuda dos outros. Mesmo que não tenhamos a intenção de parecer arrogantes ou donos da verdade, acabamos repelindo as pessoas, pois elas sentem que não têm importância para nós e se distanciam. Desaprendemos a nos relacionar e confirmamos o famoso mito da "solidão do poder"...
Agora, se não enxergamos os outros, podemos também deixar de enxergar a realidade, pois ela não é só o que vemos: é também aquilo que os outros nos mostram. Um típico exemplo disso se passou com uma amiga. Funcionária de um banco há muitos anos, havia chegado a um cargo gerencial e estava tendo muito sucesso. Um belo dia o banco foi comprado, sofreu uma reestruturação e minha amiga foi transferida para um setor menos importante. Havia algo estranho no ar, mas ela não percebia nada de anormal: afinal, era uma profissional bem-sucedida e não tinha com o que se preocupar.
Meses depois foi transferida de novo, e para um setor ainda menos importante. A família e os amigos mais chegados tentaram alertá-la de que algo drástico estava por vir, mas ela, muito autoconfiante, não deu atenção. Semanas depois, foi demitida, e só então “caiu a ficha”: estava recebendo claros sinais de que sua bem-sucedida carreira na empresa estava no fim, mas não percebia isso. É a tal história: o sucesso reforça nossa autoconfiança, o que é ótimo, mas torna-se perigoso quando nos faz incapazes de enxergar os alertas que os outros nos dão.
Pior ainda é quando nos tornamos incapazes de enxergar nós mesmos. O sucesso nos faz ter olhos para o que queremos, mas desvia a atenção daquilo que sentimos. A mente pede descanso, o corpo padece, o relacionamento afetivo balança, os amigos se afastam... E a gente faz de conta que nada está acontecendo. Até o dia em que a casa cai, ficamos doentes ou temos uma crise na vida pessoal, e não podemos mais ignorar nossas dores e desconfortos.
Por isso, fique atento: o sucesso é cego, e aliás surdo também. É maravilhoso que ele aconteça, desde que não seja às custas de outras coisas importantes na vida.
Leila Navarro
O sucesso também é cego, sabia? É natural que, quando a carreira deslancha e tudo dá certo, um sentimento de empolgação tome conta de nós. O problema é que podemos ficar cada vez mais focados em nossos objetivos e motivados para novas conquistas; passamos a só ter olhos para o sucesso e deixamos de enxergar coisas importantes na vida.
Deixamos de enxergar os outros, por exemplo. O sucesso pode nos dar a (falsa) ideia de que somos autosuficientes, poderosos, capazes de fazer tudo sozinhos – logo, não precisamos de conselhos, sugestões, opiniões e muito menos ajuda dos outros. Mesmo que não tenhamos a intenção de parecer arrogantes ou donos da verdade, acabamos repelindo as pessoas, pois elas sentem que não têm importância para nós e se distanciam. Desaprendemos a nos relacionar e confirmamos o famoso mito da "solidão do poder"...
Agora, se não enxergamos os outros, podemos também deixar de enxergar a realidade, pois ela não é só o que vemos: é também aquilo que os outros nos mostram. Um típico exemplo disso se passou com uma amiga. Funcionária de um banco há muitos anos, havia chegado a um cargo gerencial e estava tendo muito sucesso. Um belo dia o banco foi comprado, sofreu uma reestruturação e minha amiga foi transferida para um setor menos importante. Havia algo estranho no ar, mas ela não percebia nada de anormal: afinal, era uma profissional bem-sucedida e não tinha com o que se preocupar.
Meses depois foi transferida de novo, e para um setor ainda menos importante. A família e os amigos mais chegados tentaram alertá-la de que algo drástico estava por vir, mas ela, muito autoconfiante, não deu atenção. Semanas depois, foi demitida, e só então “caiu a ficha”: estava recebendo claros sinais de que sua bem-sucedida carreira na empresa estava no fim, mas não percebia isso. É a tal história: o sucesso reforça nossa autoconfiança, o que é ótimo, mas torna-se perigoso quando nos faz incapazes de enxergar os alertas que os outros nos dão.
Pior ainda é quando nos tornamos incapazes de enxergar nós mesmos. O sucesso nos faz ter olhos para o que queremos, mas desvia a atenção daquilo que sentimos. A mente pede descanso, o corpo padece, o relacionamento afetivo balança, os amigos se afastam... E a gente faz de conta que nada está acontecendo. Até o dia em que a casa cai, ficamos doentes ou temos uma crise na vida pessoal, e não podemos mais ignorar nossas dores e desconfortos.
Por isso, fique atento: o sucesso é cego, e aliás surdo também. É maravilhoso que ele aconteça, desde que não seja às custas de outras coisas importantes na vida.
Leila Navarro
* * *
[texto encaminhado por Samantha Rangel]
quarta-feira, 25 de novembro de 2009
Aqui jaz - retrato da solidão
Os coveiros, a equipe de reportagem e uma chuva torrencial foram as únicas testemunhas daquele sepultamento ocorrido no último dia 15, exatamente às 8h11. Dentro do caixão que baixou na cova rasa tomada pelo barro do Cemitério da Saudade, em Sumaré (SP), estava um homem idoso, que não foi procurado por nenhum parente ou conhecido nos últimos meses.
Nada de orações, nada de despedidas, nada de lágrimas naquela manhã. O que se viu foi apenas o trabalho rápido e sério de quem precisou enfrentar a lama e um temporal para dar um descanso final a uma pessoa que para nós, vivos, acaba sendo considerada apenas um indigente. Toda a sua história de vida, o seu passado e suas ações na face da Terra estavam apagadas. Era apenas um corpo precisando encontrar um espaço para ser, aí sim, esquecido para sempre.
Quis o destino que, até em seus momentos finais, aquele homem ficasse sozinho. A caminho de uma quadra nos fundos do cemitério, a forte chuva pegou os coveiros de surpresa. Sem condições de fazer o seu serviço, eles foram, com razão, se abrigar em um local coberto e deixaram o carrinho com o caixão embaixo de uma árvore em um dos corredores dos túmulos. A cena era tocante. Ali estava, definitivamente, uma pessoa cumprindo a sua sina de não ter ninguém ao seu lado...
Fábio Gallacci
Jornal Correio Popular – Editoria Cidades
Campinas 01/11/2009
Nada de orações, nada de despedidas, nada de lágrimas naquela manhã. O que se viu foi apenas o trabalho rápido e sério de quem precisou enfrentar a lama e um temporal para dar um descanso final a uma pessoa que para nós, vivos, acaba sendo considerada apenas um indigente. Toda a sua história de vida, o seu passado e suas ações na face da Terra estavam apagadas. Era apenas um corpo precisando encontrar um espaço para ser, aí sim, esquecido para sempre.
Quis o destino que, até em seus momentos finais, aquele homem ficasse sozinho. A caminho de uma quadra nos fundos do cemitério, a forte chuva pegou os coveiros de surpresa. Sem condições de fazer o seu serviço, eles foram, com razão, se abrigar em um local coberto e deixaram o carrinho com o caixão embaixo de uma árvore em um dos corredores dos túmulos. A cena era tocante. Ali estava, definitivamente, uma pessoa cumprindo a sua sina de não ter ninguém ao seu lado...
Fábio Gallacci
Jornal Correio Popular – Editoria Cidades
Campinas 01/11/2009
* * *
Foto de André Tuffy (02/2009)
terça-feira, 24 de novembro de 2009
domingo, 22 de novembro de 2009
Planos
Não sou um primor de organização, mas gosto das coisas certas, de uma certa arrumação, de ver os objetos no seu devido lugar e acho saudável fazer planos para o futuro. Como muita gente.
Vários dos planos que fiz da minha vida para este ano deram errado. O pior é que fiz poucos planos! Isso é normal, dependendo de certos parâmetros estabelecidos, sempre existe a possibilidade de algo dar errado e seria surpreendente se tudo desse certo. E nem é preciso lembrar de Murphy. Quando quebrei o pé e tive que ficar em casa me recuperando, vi escorrer pelo ralo do inconformismo, a cada semana, a cada dia, a cada hora [oh, Deus!], muita coisa que havia planejado para este ano. Inclusive do próximo ano – o que me deixou mais estressado.
Como o ano ainda não terminou, vou me esforçar e torcer para que alguns daqueles planos dêem certo. Sou otimista por natureza, não costumo pintar um quadro desesperador, mas quando vejo que muitas coisas fogem do meu controle, começo a vislumbrar o pior. Dura pouco. Porém, nem deveria acontecer. O que me consola é que tudo não passa de uma reação natural do ser humano. A gente se arma perante os acidentes de percurso e nem sempre consegue apenas se lamentar, sem esbravejar, sem xingar o mundo todo. No entanto, é exatamente no momento de extremo pessimismo, quando me vejo mergulhado num lago de desesperança, acuado, que vejo a bóia da realidade na superfície e a agarro me fazendo acreditar que nem tudo está perdido. Ainda bem. Só que nessa altura do campeonato, a gastrite já tomou conta do pedaço!
De qualquer forma, com o tempo me recupero bem e chuto o balde. Neste ponto, paro de planejar os meus passos (ou a grande maioria deles), deixo que muita coisa aconteça e no final acabo vendo que foi a escolha certa.
O estranho de tudo isso é o fato de tornar a acontecer ano a ano, se repetindo e parece que nunca aprendo. Faço planos, alguns não dão certo, nem me importo tanto; outros não dão certos também, mas me estresso pacas, me aborreço, fico mal, para depois apertar o botão do “nem te ligo” e o resultado final acaba sendo positivo. O ano rendeu. Apesar das perdas.
Respeito muito o Senhor Destino, mas sou daqueles que acreditam que somos nós que temos as rédeas, que optamos por um ou outro caminho e, inclusive, por deixar a coisa rolar livremente. E por decidir deixar as coisas acontecerem, mesmo ficando na mão do destino, é que vejo o quanto a vida pode preparar algumas boas surpresas. Contando com uma ajudinha da sorte, habitando em algum canto junto com as chances e os planos, e me confortando em saber que não posso saber de tudo.
Assim, vou escrevendo o roteiro da minha vida, sem saber qual será o final. Apenas que terá um fim.
* * *
Vários dos planos que fiz da minha vida para este ano deram errado. O pior é que fiz poucos planos! Isso é normal, dependendo de certos parâmetros estabelecidos, sempre existe a possibilidade de algo dar errado e seria surpreendente se tudo desse certo. E nem é preciso lembrar de Murphy. Quando quebrei o pé e tive que ficar em casa me recuperando, vi escorrer pelo ralo do inconformismo, a cada semana, a cada dia, a cada hora [oh, Deus!], muita coisa que havia planejado para este ano. Inclusive do próximo ano – o que me deixou mais estressado.
Como o ano ainda não terminou, vou me esforçar e torcer para que alguns daqueles planos dêem certo. Sou otimista por natureza, não costumo pintar um quadro desesperador, mas quando vejo que muitas coisas fogem do meu controle, começo a vislumbrar o pior. Dura pouco. Porém, nem deveria acontecer. O que me consola é que tudo não passa de uma reação natural do ser humano. A gente se arma perante os acidentes de percurso e nem sempre consegue apenas se lamentar, sem esbravejar, sem xingar o mundo todo. No entanto, é exatamente no momento de extremo pessimismo, quando me vejo mergulhado num lago de desesperança, acuado, que vejo a bóia da realidade na superfície e a agarro me fazendo acreditar que nem tudo está perdido. Ainda bem. Só que nessa altura do campeonato, a gastrite já tomou conta do pedaço!
De qualquer forma, com o tempo me recupero bem e chuto o balde. Neste ponto, paro de planejar os meus passos (ou a grande maioria deles), deixo que muita coisa aconteça e no final acabo vendo que foi a escolha certa.
O estranho de tudo isso é o fato de tornar a acontecer ano a ano, se repetindo e parece que nunca aprendo. Faço planos, alguns não dão certo, nem me importo tanto; outros não dão certos também, mas me estresso pacas, me aborreço, fico mal, para depois apertar o botão do “nem te ligo” e o resultado final acaba sendo positivo. O ano rendeu. Apesar das perdas.
Respeito muito o Senhor Destino, mas sou daqueles que acreditam que somos nós que temos as rédeas, que optamos por um ou outro caminho e, inclusive, por deixar a coisa rolar livremente. E por decidir deixar as coisas acontecerem, mesmo ficando na mão do destino, é que vejo o quanto a vida pode preparar algumas boas surpresas. Contando com uma ajudinha da sorte, habitando em algum canto junto com as chances e os planos, e me confortando em saber que não posso saber de tudo.
Assim, vou escrevendo o roteiro da minha vida, sem saber qual será o final. Apenas que terá um fim.
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[Ilustração de Mark Kostabi, “The Big Drawing” (1991)]
quinta-feira, 12 de novembro de 2009
Educação: uma porta de saída
Ok, eu já considerava ter passado da hora de postar algo por aqui. As cobranças, como já aconteceram outras vezes, vieram. Não me importo com isso. Pelo contrário. Já tinha ensaiado escrever ou reproduzir algo, porém, tinha que vir acompanhado de um clipe, como tem sido de praxe ultimamente nas minhas primeiras postagens de cada mês. E para contentar o Marcello e a Samantha - que descobriram esta minha opção - o clipe tem alguma coisa a ver com o mês da postagem. E é bom que eles saibam que isso não será sempre assim, não. Como tudo na vida, um dia acaba. (risos)
Ao menos eu tenho dado sorte. Ainda. Penso numa determinada música, procuro o clipe e encontro. Nem sempre é aquele que eu gostaria, mas ou dá pro gasto ou supera minhas expectativas.
Estava vasculhando minhas anotações e antes de encontrar alguma coisa, lembrei de uma canção interessante do Natiruts, Povo Brasileiro, e, por sorte, encontrei um clipe bem bacaninha no Youtube. Não lembrei da música por acaso - fui induzido pelo meu subconsciente (é, eu acredito nisso sim!), pois recentemente li algumas matérias num jornal e participei de um fórum virtual sobre o mesmo tema: a segregação social.
Gosto de debates, principalmente quando a discussão toma rumos interessantes e quando proporciona um aprendizado mais amplo aos participantes. Neste que participei, concluímos que (e não poderia ser diferente), a diminuição da segregação social se tornará possível com a melhora da qualidade da educação pública, substancialmente, não se limitando apenas à instrução, de uma maneira que afete todas as classes sociais. Muito se falou sobre evoluções radicais, defendendo novas formas de polarização sócio-econômica, maior participação da sociedade e das instituições e empresas socialmente responsáveis (estas já têm uma participação considerável), e a ocorrência de uma mutação econômica emergente, no entanto, sempre convergindo para a educação.
É óbvio que qualquer governo já sabe o que precisa ser realizado, quais as diretrizes que devem ser aplicadas, assim como os formadores de opinião influentes nas administrações públicas reconhecem sua importância e necessidade. Mas porque tão pouco é efetivamente feito? Qual o motivo da lentidão? Houve muitas respostas no fórum e existem diversas dentro de cada um de nós. Algumas delas têm a ver com os nossos braços cruzados e a nossa impotência.
Bom, eu vou deixar uma pequena contribuição por aqui, talvez consiga arrancar uma reflexão, esperando que cada um faça a sua parte - se possível, claro -, após ler a frase abaixo, ver as imagens do clipe e ouvir a letra da canção.
* * *
Ao menos eu tenho dado sorte. Ainda. Penso numa determinada música, procuro o clipe e encontro. Nem sempre é aquele que eu gostaria, mas ou dá pro gasto ou supera minhas expectativas.
Estava vasculhando minhas anotações e antes de encontrar alguma coisa, lembrei de uma canção interessante do Natiruts, Povo Brasileiro, e, por sorte, encontrei um clipe bem bacaninha no Youtube. Não lembrei da música por acaso - fui induzido pelo meu subconsciente (é, eu acredito nisso sim!), pois recentemente li algumas matérias num jornal e participei de um fórum virtual sobre o mesmo tema: a segregação social.
Gosto de debates, principalmente quando a discussão toma rumos interessantes e quando proporciona um aprendizado mais amplo aos participantes. Neste que participei, concluímos que (e não poderia ser diferente), a diminuição da segregação social se tornará possível com a melhora da qualidade da educação pública, substancialmente, não se limitando apenas à instrução, de uma maneira que afete todas as classes sociais. Muito se falou sobre evoluções radicais, defendendo novas formas de polarização sócio-econômica, maior participação da sociedade e das instituições e empresas socialmente responsáveis (estas já têm uma participação considerável), e a ocorrência de uma mutação econômica emergente, no entanto, sempre convergindo para a educação.
É óbvio que qualquer governo já sabe o que precisa ser realizado, quais as diretrizes que devem ser aplicadas, assim como os formadores de opinião influentes nas administrações públicas reconhecem sua importância e necessidade. Mas porque tão pouco é efetivamente feito? Qual o motivo da lentidão? Houve muitas respostas no fórum e existem diversas dentro de cada um de nós. Algumas delas têm a ver com os nossos braços cruzados e a nossa impotência.
Bom, eu vou deixar uma pequena contribuição por aqui, talvez consiga arrancar uma reflexão, esperando que cada um faça a sua parte - se possível, claro -, após ler a frase abaixo, ver as imagens do clipe e ouvir a letra da canção.
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“Se a educação sozinha não pode transformar a sociedade, tampouco sem ela a sociedade muda”.
Paulo Freire
Paulo Freire
sábado, 31 de outubro de 2009
Respeito
"Ouça: respeite mesmo o que é ruim em você - respeite sobretudo o que imagina que é ruim em você - não copie uma pessoa ideal, copie você mesma - é esse seu único meio de viver."
Clarice Lispector
Clarice Lispector
[frase atribuída à escritora – retirada de uma carta publicada por Caio Fernando Abreu em 1995 – www.tvcultura.com.br]
quinta-feira, 29 de outubro de 2009
Struck
Minha amiga Rosângela Araújo teve a feliz ideia de me enviar um link muito interessante, que dá acesso ao curta-metragem Struck The Film. Vi no site oficial que ele ganhou diversos prêmios. Merecidamente, diga-se de passagem.
Joel, o personagem principal, é flechado no peito e aparentemente não tem como retirar a flecha. Ele tenta levar uma vida normal, apesar de poucos aceitarem o que lhe aconteceu – inclusive suas possíveis pretendentes. Aos poucos, ele aprende a lidar não somente com a presença da flecha em seu corpo, mas com sua dolorosa solidão. Um filme deliciosamente metafórico e muito poético, que além de engraçado é capaz de inspirar corações. Principalmente de quem já sabe o que uma flechada desse tipo pode causar.
São sete preciosos minutos que você não vai desperdiçar ao assistir. E atenção: continue assistindo após os créditos finais. Tentei postar aqui a versão com som original, mas não consegui. Para tentar deixar registrado (caso algum dia o site oficial do curta fique indisponível), baixei uma versão que ainda está no Youtube. De qualquer forma, recomendo que você não deixe de assistir a versão original no site: http://www.struckthefilm.com/
Divirta-se e emocione-se.
Joel, o personagem principal, é flechado no peito e aparentemente não tem como retirar a flecha. Ele tenta levar uma vida normal, apesar de poucos aceitarem o que lhe aconteceu – inclusive suas possíveis pretendentes. Aos poucos, ele aprende a lidar não somente com a presença da flecha em seu corpo, mas com sua dolorosa solidão. Um filme deliciosamente metafórico e muito poético, que além de engraçado é capaz de inspirar corações. Principalmente de quem já sabe o que uma flechada desse tipo pode causar.
São sete preciosos minutos que você não vai desperdiçar ao assistir. E atenção: continue assistindo após os créditos finais. Tentei postar aqui a versão com som original, mas não consegui. Para tentar deixar registrado (caso algum dia o site oficial do curta fique indisponível), baixei uma versão que ainda está no Youtube. De qualquer forma, recomendo que você não deixe de assistir a versão original no site: http://www.struckthefilm.com/
Divirta-se e emocione-se.
segunda-feira, 26 de outubro de 2009
As ruas
As ruas de Buenos Aires
já são minhas entranhas.
Não as ávidas ruas,
incômodas de gente e de bulício
mas as ruas indolentes do bairro,
quase invisíveis de tão usuais,
enternecidas de penumbra e de ocaso
e aquelas mais ao longe
carentes de árvores piedosas
onde austeras casinhas apenas se aventuram,
abrumadas por imortais distâncias,
a perder-se na profunda visão
de céu e de planura.
São para o solitário uma promessa
porque milhares de almas singulares as povoam,
únicas ante Deus e no tempo
e sem dúvida preciosas.
Para o Oeste, o Norte e o Sul
se desfraldaram - e são também a pátria - as ruas;
oxalá nos versos que traço
estejam essas bandeiras.
Jorge Luis Borges
já são minhas entranhas.
Não as ávidas ruas,
incômodas de gente e de bulício
mas as ruas indolentes do bairro,
quase invisíveis de tão usuais,
enternecidas de penumbra e de ocaso
e aquelas mais ao longe
carentes de árvores piedosas
onde austeras casinhas apenas se aventuram,
abrumadas por imortais distâncias,
a perder-se na profunda visão
de céu e de planura.
São para o solitário uma promessa
porque milhares de almas singulares as povoam,
únicas ante Deus e no tempo
e sem dúvida preciosas.
Para o Oeste, o Norte e o Sul
se desfraldaram - e são também a pátria - as ruas;
oxalá nos versos que traço
estejam essas bandeiras.
Jorge Luis Borges
Poema extraído do livro Fervor de Buenos Aires.
Foto de Rodolpho Oliveira.
quarta-feira, 21 de outubro de 2009
Inferno astral
Sempre brinquei com essa coisa do inferno astral, uma espécie de força sobrenatural que, hipoteticamente, talvez, afeta o ser humano quando se está perto da data de aniversário, cerca de trinta dias antes. Apesar de não duvidar que isso fosse possível, levava na brincadeira. Brincava quando me servia de desculpa para qualquer coisa ruim ou desajustada que acontecia comigo no mesmo período. Achava que se acreditasse em sua existência, aí sim aconteceria de verdade.
Agora vejo que eu "pensava" que era desculpa. Agora acredito piamente. Estava revirando meu baú mental do passado e fui obrigado a admitir que ele existe. Pelo menos comigo. Ou é uma bruta coincidência. Mas o pior é que não acredito em coincidências.
Ainda mais pelos acontecimentos recentes. Começou no início do mês quando quebrei um pé. O estressante não é ter de ficar sentado ou deitado com o pé pra cima o tempo todo. Muitos filmes, muita tv, muitas leituras e muita internet. Não posso reclamar. Mas ficar em casa, com movimentos limitados e ainda ter de andar de muletas, tá sendo um porre!
Passou pouco da metade do mês, mas pela quantidade de notícias desagradáveis que recebi (e que tive de dar); por ler algumas mensagens que me deixaram puto; por mais de um ruído de comunicação dentro da família; pela perda de um amigo muito querido; por ter sido mais curioso que um gato e ver coisas desagradáveis pelo mesmo motivo, me roubando certas esperanças; e a cada hora um funcionário do serviço médico falando uma coisa pra ser providenciada sobre a perícia da minha lesão (uma "burrocracia" sem tamanho, tantas idas e vindas sem sucesso), realmente me estressaram, no limite. E pra piorar tudo, minha gastrite atacando novamente. Assim fica difícil não acreditar que estou no meu inferno astral. Ou está acontecendo pelo fato de achar que existe? Sei lá. Já não sei mais.
Justo eu, que sou reconhecido pelos amigos mais próximos como dono de uma paciência de Jó, com uma grande capacidade de afugentar o tédio, o pessimismo e os pensamentos ruins, sempre cheio de positivismo e muito otimista, tenho que considerar que é um outubro cinza.
Só não é negro porque outubro me trouxe algumas coisas boas também, como novas amizades; meu notebook; um maior entendimento dentro de casa; o reconhecimento de quem é realmente amigo; e o horário de verão que eu adoro.
É. Não está tão ruim. Mas continua cinza. A previsão é de pancadas de chuva. Por sorte possuo um guarda-chuva gigante. Apenas tinha esquecido de abrir.
* * *
segunda-feira, 28 de setembro de 2009
Ocupando a mesma jaula
“Eu não vivo com você. Nós ocupamos a mesma jaula'', diz Margaret (Elizabeth Taylor) ao personagem Brick (Paul Newman) em ''Gata em Teto de Zinco Quente'' (1958), no filme de Richard Brooks, baseado na peça de Tennessee Williams.
Filme que recomendo para todo mundo. Além das ótimas interpretações, os diálogos deixam os apreciadores da palavra totalmente alucinados diante de tanta maravilha.
Encontrei esta frase memorável no UOL Cinema. Quem já assistiu ao filme, sabe o quanto é significante na trama, nos levando a refletir na estranha prisão interior em que os personagens se submetem.
Esta frase cabe na vida (se é que podemos chamar uma relação assim de vida) de muitos casais no mundo inteiro. Nem todos sobrevivem. Nem todos suportam. Nem todos fingem que não acontece.
Nem todos percebem. O que é pior.
Filme que recomendo para todo mundo. Além das ótimas interpretações, os diálogos deixam os apreciadores da palavra totalmente alucinados diante de tanta maravilha.
Encontrei esta frase memorável no UOL Cinema. Quem já assistiu ao filme, sabe o quanto é significante na trama, nos levando a refletir na estranha prisão interior em que os personagens se submetem.
Esta frase cabe na vida (se é que podemos chamar uma relação assim de vida) de muitos casais no mundo inteiro. Nem todos sobrevivem. Nem todos suportam. Nem todos fingem que não acontece.
Nem todos percebem. O que é pior.
sábado, 19 de setembro de 2009
Devoro-te (três)
quarta-feira, 16 de setembro de 2009
segunda-feira, 14 de setembro de 2009
Devoro-te (um)
quarta-feira, 9 de setembro de 2009
Superficialidade na net
Recebi uma mensagem de um amigo que me disse muitas vezes sentir vergonha de ser homem pelas barbaridades que se vê na internet. Pessoas que não se respeitam e nem respeitam seu semelhante. A superficialidade é a característica marcante nessas pessoas.
Os grandes pensadores da humanidade (homens e mulheres) foram pessoas que dedicaram suas vidas ao estudo. Veja que hoje o hábito da leitura é escasso, e, geralmente, os livros escolhidos não são formadores de opinião inteligente. Mais do que estudar, é necessário uma metodologia de investigação científica. Isso resulta numa opinião madura e inteligente em torno da construção das ideias e do conhecimento, o que infelizmente vemos raramente hoje em dia.
Neste caso, a democracia é uma praga, porque as pessoas "puxam a descarga" dos seus pensamentos superficiais e descarregam na internet, o que é degradante... Você já encontrou um rubi ou esmeralda numa esquina qualquer? Difícil, né? A superficialidade é produto da formação de opinião em torno do "lixo cultural."
Lembre-se sempre: "uma aparência bonita encanta, mas uma palavra bem dita cativa."
Os grandes pensadores da humanidade (homens e mulheres) foram pessoas que dedicaram suas vidas ao estudo. Veja que hoje o hábito da leitura é escasso, e, geralmente, os livros escolhidos não são formadores de opinião inteligente. Mais do que estudar, é necessário uma metodologia de investigação científica. Isso resulta numa opinião madura e inteligente em torno da construção das ideias e do conhecimento, o que infelizmente vemos raramente hoje em dia.
Neste caso, a democracia é uma praga, porque as pessoas "puxam a descarga" dos seus pensamentos superficiais e descarregam na internet, o que é degradante... Você já encontrou um rubi ou esmeralda numa esquina qualquer? Difícil, né? A superficialidade é produto da formação de opinião em torno do "lixo cultural."
Lembre-se sempre: "uma aparência bonita encanta, mas uma palavra bem dita cativa."
Solange Vargas
sexta-feira, 4 de setembro de 2009
Saudosismo
Hoje estou saudosista.
A chuvinha de hoje cedo me fez lembrar do cheiro da terra molhada do campo, das viagens pra Catanduva, da casa da minha Tia Geralda.
Desde cedo, estou lembrando de momentos agradáveis do passado, do cheiro do bolo de fubá quentinho no finalzinho da tarde, da caneca de porcelana com café com leite, dos passarinhos cantando no quintal antes de procurarem um lugar acolhedor para dormir.
Também lembrei de quando eu chegava da praia, em Santos, e após um banho gostoso, minha mãe, enquanto assistia novela, me fazia cafuné. Uma dessas novelas era Marina, e era reconfortante ouvir a música de abertura na voz do Beto Guedes junto com a voz afinada da minha mãe.
Quantas vezes não tirei um cochilo assim, embalado pela serenidade, sentindo os dedos carinhosos dela me levando para um mundo de paz e sossego?...
Impossível conter o choro da saudade.
A chuvinha de hoje cedo me fez lembrar do cheiro da terra molhada do campo, das viagens pra Catanduva, da casa da minha Tia Geralda.
Desde cedo, estou lembrando de momentos agradáveis do passado, do cheiro do bolo de fubá quentinho no finalzinho da tarde, da caneca de porcelana com café com leite, dos passarinhos cantando no quintal antes de procurarem um lugar acolhedor para dormir.
Também lembrei de quando eu chegava da praia, em Santos, e após um banho gostoso, minha mãe, enquanto assistia novela, me fazia cafuné. Uma dessas novelas era Marina, e era reconfortante ouvir a música de abertura na voz do Beto Guedes junto com a voz afinada da minha mãe.
Quantas vezes não tirei um cochilo assim, embalado pela serenidade, sentindo os dedos carinhosos dela me levando para um mundo de paz e sossego?...
Impossível conter o choro da saudade.
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A lição sabemos de cor
Só nos resta aprender
Só nos resta aprender
* * *
A música do clipe, Sol de Primavera, com Beto Guedes, é a da abertura da novela Marina. As imagens não são lá aquelas coisas. O que importa mesmo é a canção.
* * *
Foto de: Shaun Lowe (2004).
domingo, 30 de agosto de 2009
Um homem provisório
Você já pensou em ser pai, Brito?
Então era isso? Ele quase riu enquanto apertava a tecla do controle-remoto e desligava a TV.
Brito não ligava para crianças. Não era uma questão de gostar ou não gostar: não se importava com elas. Mas sabia que não queria ser pai.
Já pensei, sim.
E?
Não quero ter filhos.
Marlene raspou o fundo do pote com a colher. E estreitou ainda mais os olhos. Brito não conhecia a expressão que viu em seu rosto.
É definitivo?
É.
Ela levou o pote de sorvete para a cozinha. Quando retornou, deitou se no sofá e apoiou a cabeça no colo de Brito. Ele pensou que Marlene fosse chorar. Mas ela sorriu. Olhando nos olhos dele.
E se eu pedisse?
Brito pôs o dedo sobre uma pinta no pescoço dela.
Você pediria mesmo sabendo que eu não quero?
Não, Marlene disse.
Continuava sorrindo.
Brito se recordava com freqüência dessa conversa. A trinca na represa. Às vezes achava que deveria ter explicado suas razões. Poderia morrer a qualquer momento. Fazia parte, acontecia todos os dias com gente que ele conhecia. Achava que vivia o tempo todo na condição de homem com os dias contados. Um homem provisório.
Se pensasse numa escala de felicidade, Marlene diria que ela e Brito tinham descido para o nível seis. Quando foram para a cama naquela noite, ela comentou que fazia dez meses que estavam juntos.
Eu sei, Brito disse.
E saiu da cama para pegar o presente que comprara para ela três dias antes. Uma caixinha de música. Com um tema que Marlene gostava de assobiar. Uma valsa.
Fizeram amor. Sem proteção nenhuma, como vinha acontecendo havia meses. Brito não tinha como saber, mas foi a penúltima vez que isso aconteceu.
Então era isso? Ele quase riu enquanto apertava a tecla do controle-remoto e desligava a TV.
Brito não ligava para crianças. Não era uma questão de gostar ou não gostar: não se importava com elas. Mas sabia que não queria ser pai.
Já pensei, sim.
E?
Não quero ter filhos.
Marlene raspou o fundo do pote com a colher. E estreitou ainda mais os olhos. Brito não conhecia a expressão que viu em seu rosto.
É definitivo?
É.
Ela levou o pote de sorvete para a cozinha. Quando retornou, deitou se no sofá e apoiou a cabeça no colo de Brito. Ele pensou que Marlene fosse chorar. Mas ela sorriu. Olhando nos olhos dele.
E se eu pedisse?
Brito pôs o dedo sobre uma pinta no pescoço dela.
Você pediria mesmo sabendo que eu não quero?
Não, Marlene disse.
Continuava sorrindo.
Brito se recordava com freqüência dessa conversa. A trinca na represa. Às vezes achava que deveria ter explicado suas razões. Poderia morrer a qualquer momento. Fazia parte, acontecia todos os dias com gente que ele conhecia. Achava que vivia o tempo todo na condição de homem com os dias contados. Um homem provisório.
Se pensasse numa escala de felicidade, Marlene diria que ela e Brito tinham descido para o nível seis. Quando foram para a cama naquela noite, ela comentou que fazia dez meses que estavam juntos.
Eu sei, Brito disse.
E saiu da cama para pegar o presente que comprara para ela três dias antes. Uma caixinha de música. Com um tema que Marlene gostava de assobiar. Uma valsa.
Fizeram amor. Sem proteção nenhuma, como vinha acontecendo havia meses. Brito não tinha como saber, mas foi a penúltima vez que isso aconteceu.
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Extraído do livro Cabeça a prêmio, de Marçal Aquino.
Foto de Sebi Messina, Lonely Walking Man (2003)
segunda-feira, 24 de agosto de 2009
Um povo que não lê
Não é apenas por ser adepto do Consumo Consciente que nos últimos anos tenho ido ao trabalho de micro-ônibus e na volta para casa faço uma boa caminhada. Afinal, com a vida sedentária que levo, vem bem a calhar. E com a vantagem de não morar muito longe do trabalho.
Como moro perto do ponto final, sempre sento bem no fundo. E hoje aconteceu uma coisa engraçada. São cinco bancos, um ao lado do outro. Normalmente, o micro-ônibus não lota, porém, os passageiros preferem sentar no fundo também. Sendo assim, logo tive como vizinhos, da esquerda para a direita: uma moça, um rapaz, um senhor idoso e outra moça. Aconteceu que a moça ao meu lado estava lendo um livro; o rapaz também. E eu. Os três usando fone de ouvido. Imagine a cena. Um do ladinho do outro! Não tive como conter o riso. No entanto, isso é um bom sinal, já que muitos consideram que o povo brasileiro não tem o hábito da leitura.
Um amigo me contou que não consegue mais andar de ônibus sem ler alguma coisa, desde que dê pra ir sentado, claro. Falei pra ele que também estou nessa e, exagerando, emendei que só não leio bula de remédio por causa do tamanho da letra. Com o balanço e letra minúscula, não dá, né?
Raramente encontro alguém lendo no transporte público, mas tenho notado que muitas pessoas estão lendo o jornal Já (uma publicação de linguagem muito popular, de circulação diária, impressa no formato tablóide, aqui de Campinas). Outro dia, contei oito pessoas lendo. Sem contar aquelas que esticavam o pescoço. Até que está bom, para um país que não lê.
Outro dia, dentro do micro-ônibus também, vi um homem lendo a revista Você S/A, de pé, usando terno e uma maleta executiva a tiracolo que insistia em balançar e bater no ombro de uma senhora - ela perguntou duas vezes se queria que ela levasse a maleta para ele - e ele, educadamente, insistiu em recusar... E a pasta batendo no ombro da mulher... Aquilo estava me irritando. Ele parecia muito interessado na revista. Num país que não lê.
Na verdade, esse pessoalzinho todo estava aproveitando bem o tempo. Procuro aproveitar para ler em qualquer lugar onde normalmente ficaria ocioso. Quando vou ao banco, levo algo pra ler na fila. Se vou pagar uma conta numa loja, mesma coisa. E no banheiro de casa, então? Se não é revista de filme é gibi da Mônica.
E ainda estou lendo quatro livros, pode isso?! Aliás, estou enrolando muito para terminar todos eles. Vagabundagem minha mesmo. Estou com o péssimo hábito de ler só dentro do micro-ônibus, indo ao trabalho. Cato um dos quatro e vamo’bora! No resto dos dias e no fim de semana: só rua, internet e televisão.
E ainda tenho a cara de pau de pedir dicas de leitura aos amigos. Mas devia evitar, porque pretendo ler logo a série A Torre Negra, do Stephen King (O Pistoleiro, o primeiro volume, é um dos quatro que estou lendo). Se a minha amiga Vivien ler isto vai ficar arrasada: foi ela que me deu de presente o primeiro volume. Detalhe: em fevereiro de 2005!
E olha que o livro é muito interessante - é um gênero que curto pacas: fantasia (no estilo de Senhor dos Anéis e lendas do Rei Arthur) – misturado com faroeste.
Que nada, amigos, mandem as dicas, assim engordo a minha lista. Num país que não lê.
Márcio Luiz Soares
Como moro perto do ponto final, sempre sento bem no fundo. E hoje aconteceu uma coisa engraçada. São cinco bancos, um ao lado do outro. Normalmente, o micro-ônibus não lota, porém, os passageiros preferem sentar no fundo também. Sendo assim, logo tive como vizinhos, da esquerda para a direita: uma moça, um rapaz, um senhor idoso e outra moça. Aconteceu que a moça ao meu lado estava lendo um livro; o rapaz também. E eu. Os três usando fone de ouvido. Imagine a cena. Um do ladinho do outro! Não tive como conter o riso. No entanto, isso é um bom sinal, já que muitos consideram que o povo brasileiro não tem o hábito da leitura.
Um amigo me contou que não consegue mais andar de ônibus sem ler alguma coisa, desde que dê pra ir sentado, claro. Falei pra ele que também estou nessa e, exagerando, emendei que só não leio bula de remédio por causa do tamanho da letra. Com o balanço e letra minúscula, não dá, né?
Raramente encontro alguém lendo no transporte público, mas tenho notado que muitas pessoas estão lendo o jornal Já (uma publicação de linguagem muito popular, de circulação diária, impressa no formato tablóide, aqui de Campinas). Outro dia, contei oito pessoas lendo. Sem contar aquelas que esticavam o pescoço. Até que está bom, para um país que não lê.
Outro dia, dentro do micro-ônibus também, vi um homem lendo a revista Você S/A, de pé, usando terno e uma maleta executiva a tiracolo que insistia em balançar e bater no ombro de uma senhora - ela perguntou duas vezes se queria que ela levasse a maleta para ele - e ele, educadamente, insistiu em recusar... E a pasta batendo no ombro da mulher... Aquilo estava me irritando. Ele parecia muito interessado na revista. Num país que não lê.
Na verdade, esse pessoalzinho todo estava aproveitando bem o tempo. Procuro aproveitar para ler em qualquer lugar onde normalmente ficaria ocioso. Quando vou ao banco, levo algo pra ler na fila. Se vou pagar uma conta numa loja, mesma coisa. E no banheiro de casa, então? Se não é revista de filme é gibi da Mônica.
E ainda estou lendo quatro livros, pode isso?! Aliás, estou enrolando muito para terminar todos eles. Vagabundagem minha mesmo. Estou com o péssimo hábito de ler só dentro do micro-ônibus, indo ao trabalho. Cato um dos quatro e vamo’bora! No resto dos dias e no fim de semana: só rua, internet e televisão.
E ainda tenho a cara de pau de pedir dicas de leitura aos amigos. Mas devia evitar, porque pretendo ler logo a série A Torre Negra, do Stephen King (O Pistoleiro, o primeiro volume, é um dos quatro que estou lendo). Se a minha amiga Vivien ler isto vai ficar arrasada: foi ela que me deu de presente o primeiro volume. Detalhe: em fevereiro de 2005!
E olha que o livro é muito interessante - é um gênero que curto pacas: fantasia (no estilo de Senhor dos Anéis e lendas do Rei Arthur) – misturado com faroeste.
Que nada, amigos, mandem as dicas, assim engordo a minha lista. Num país que não lê.
Márcio Luiz Soares
* * *
Foto de Paul Gardner, do álbum A Walk Through London II.
[Claro que a foto não foi feita no Brasil]
[Claro que a foto não foi feita no Brasil]
quinta-feira, 20 de agosto de 2009
O Último Poema
Assim eu quereria meu último poema
Que fosse terno dizendo as coisas mais simples e menos intencionais
Que fosse ardente como um soluço sem lágrimas
Que tivesse a beleza das flores quase sem perfume
A pureza da chama em que se consomem os diamantes mais límpidos
A paixão dos suicidas que se matam sem explicação.
Manuel Bandeira
Que fosse terno dizendo as coisas mais simples e menos intencionais
Que fosse ardente como um soluço sem lágrimas
Que tivesse a beleza das flores quase sem perfume
A pureza da chama em que se consomem os diamantes mais límpidos
A paixão dos suicidas que se matam sem explicação.
Manuel Bandeira
domingo, 16 de agosto de 2009
Encontro literário
- Você foi no encontro literário, no SESC?
- Nas três noites. Foi muito interessante. É legal conhecer alguns escritores, saber como trabalham, como pensam, essas coisas.
- Verdade. Também gosto de conhecer esse meio. Foram quatro escritores, é isso? Eles estavam lançando livros?
- Cláudia Tajes, Marçal Aquino, Lourenço Mutarelli e Marcelino Freire. Não estavam lançando livros. Apenas fizeram comentários. Um comentava as obras do outro e assim por diante. E falavam dos seus próprios livros também, claro. Houve leituras de trechos, inclusive. E por causa disso tudo, logo no segundo dia, fui procurar um dos livros do Marçal Aquino, lá mesmo, na biblioteca. Aliás, estou “culpando” esse autor por me fazer ler quatro livros ao mesmo tempo. Um dele e outros três que eu já estava lendo. (risos)
- Quatro?!? Está lendo quatro livros juntos?
- Estou.
- Para de ler um e começa outro, mais interessante, ou nada disso?
- Não. Apenas dou um tempo, sem perder o interesse. Uma pausa. Dou um tempo em um, para ler outro e depois volto. Tem dia que leio um pela manhã e outro antes de dormir. Assim. (risos)
- Como consegue? Não atrapalha? Eu acho que não conseguiria. Acho que me confundiria ou só voltaria a ler um deles quando terminasse algum.
- Conseguiria sim, se tentasse. Você não assiste duas ou três novelas? É parecido. Mas entendo você. Eu também achava estranho quando ficava sabendo que outras pessoas faziam isso, e sempre achei interessante, mesmo assim. Faz quatro anos que peguei esse hábito pra valer. Não é sempre que ocorre, mas não evito. Geralmente são apenas dois livros.
- Conheço pessoas que devoram livros, mas assim já é demais! (risos).
- Nas três noites. Foi muito interessante. É legal conhecer alguns escritores, saber como trabalham, como pensam, essas coisas.
- Verdade. Também gosto de conhecer esse meio. Foram quatro escritores, é isso? Eles estavam lançando livros?
- Cláudia Tajes, Marçal Aquino, Lourenço Mutarelli e Marcelino Freire. Não estavam lançando livros. Apenas fizeram comentários. Um comentava as obras do outro e assim por diante. E falavam dos seus próprios livros também, claro. Houve leituras de trechos, inclusive. E por causa disso tudo, logo no segundo dia, fui procurar um dos livros do Marçal Aquino, lá mesmo, na biblioteca. Aliás, estou “culpando” esse autor por me fazer ler quatro livros ao mesmo tempo. Um dele e outros três que eu já estava lendo. (risos)
- Quatro?!? Está lendo quatro livros juntos?
- Estou.
- Para de ler um e começa outro, mais interessante, ou nada disso?
- Não. Apenas dou um tempo, sem perder o interesse. Uma pausa. Dou um tempo em um, para ler outro e depois volto. Tem dia que leio um pela manhã e outro antes de dormir. Assim. (risos)
- Como consegue? Não atrapalha? Eu acho que não conseguiria. Acho que me confundiria ou só voltaria a ler um deles quando terminasse algum.
- Conseguiria sim, se tentasse. Você não assiste duas ou três novelas? É parecido. Mas entendo você. Eu também achava estranho quando ficava sabendo que outras pessoas faziam isso, e sempre achei interessante, mesmo assim. Faz quatro anos que peguei esse hábito pra valer. Não é sempre que ocorre, mas não evito. Geralmente são apenas dois livros.
- Conheço pessoas que devoram livros, mas assim já é demais! (risos).
* * *
Essa foi uma conversa que tive com minha amiga Rafaela pelo Google Talk. Na verdade, essa conversa aconteceu há poucos minutos. Eu estava pensando em comentar por aqui sobre um evento literário que o SESC de Campinas promoveu e resolvi colocar parte da conversa para começar. A Rafaela não é a única que acha isso estranho. Não acho que isso seja uma coisa absurda. É exatamente como a comparação que eu fiz. Simples. E quando se está lendo um livro didático ou complexo, é até melhor, ajuda a relaxar.
Quanto ao encontro literário, o SESC está de parabéns pela iniciativa. Esse evento teve o nome de Versões, que também tinha em seu cardápio um sarau antecedendo cada encontro. Foi um pouco tímido, poucas pessoas participaram e nem todos se levantaram para ler ao microfone. Mas o pouco de gente que foi também já é motivo para surpresas e satisfação, tendo em vista que esse tipo de sarau, em Campinas, aberto ao público, organizado por uma empresa principalmente, é bem raro.
De todos que se levantaram para fazer sua leitura, dividir com a plateia, apenas uma moça, Andréia, declamou sem ler, se valendo apenas da memória. Foi um poema magnífico de Augusto dos Anjos. Pena que não descobri o título. Também teve leitura de composições próprias, como o de um homem que leu (esse não memorizou, mesmo sendo dele) um curto poema escrito no guardanapo. Foi um momento engraçado, pois ele se esforçava para ler o que estava escrito – não decifrava sua própria letra! Sei como é isso, quando escrevo rápido, minha letra fica pior que letra de médico e nem eu entendo tudo de imediato.
Confesso que uma ou outra poesia eu não entendi muito bem. Senti a necessidade de ler e, assim, reler e refletir. Se eu tivesse anotado os títulos e seus autores, poderia procurar depois. Fico me xingando o tempo todo por não ter levado papel e caneta, justo eu que procuro sempre carregar essas ferramentas em determinados eventos. Um absurdo!
O encontro entre autores foi acima das minhas expectativas. Foi exatamente como o banner de divulgação do evento: “Versões é um projeto de curadoria compartilhada que promove o encontro e a crítica entre diversos escritores da literatura contemporânea brasileira. O SESC convida um autor que escolhe o trabalho de outro autor para comentar. As escolhas se interligam de forma a criar um panorama de nossa produção literária atual.”
Esse universo é muito interessante. Saber como funciona o processo criativo de cada um, seus preparativos, seus métodos, seus rituais e locais de trabalho, suas oficinas, desperta a curiosidade.
Marçal Aquino disse que, por gostar de ouvir a conversa alheia, o auxilia a escrever seus textos. Afirmou que não é bom para escrever diálogos, mas que presta muita atenção quando presencia certas conversas, apenas escutando, discretamente. Engraçado seu comentário de que adorava as linhas cruzadas no telefone, afinal a partir delas poderia sair algo para botar nos seus textos. Também falou que muitas vezes uma só palavra ou uma frase inspira a escrever. É dele o livro que peguei (correndo), na biblioteca do SESC, Cabeça a Prêmio. Provavelmente, vou comentar depois por aqui.
Também vou querer ler os livros dos outros escritores. Em breve, vou atrás do Cheiro do Ralo, de Lourenço Mutarelli. Esse inspirou um filme. Revi recentemente, e sei lá porque ainda não comentei no blog. Esse cara é uma figura. É um quadrinista conhecido (autor de Caixa de Areia, uma HQ simplesmente estupenda), mas se cansou dessa arte e resolveu se entregar de vez à literatura. Disse que escreve melhor com uma garrafa de bebida do lado e ouvindo música concreta o tempo todo. E que depois de participar do Cheiro do Ralo, como ator, e não como roteirista, descobriu mais essa veia artística e mergulhou de cabeça nesse ofício também.
Esse encontro durou três noites seguidas. Espero que tenha outras Versões, pois deixou a plateia com “gostinho de quero mais”. Sou tão guloso por esse tipo de evento que esse “gostinho” nunca vai cessar.
Márcio Luiz Soares
Quanto ao encontro literário, o SESC está de parabéns pela iniciativa. Esse evento teve o nome de Versões, que também tinha em seu cardápio um sarau antecedendo cada encontro. Foi um pouco tímido, poucas pessoas participaram e nem todos se levantaram para ler ao microfone. Mas o pouco de gente que foi também já é motivo para surpresas e satisfação, tendo em vista que esse tipo de sarau, em Campinas, aberto ao público, organizado por uma empresa principalmente, é bem raro.
De todos que se levantaram para fazer sua leitura, dividir com a plateia, apenas uma moça, Andréia, declamou sem ler, se valendo apenas da memória. Foi um poema magnífico de Augusto dos Anjos. Pena que não descobri o título. Também teve leitura de composições próprias, como o de um homem que leu (esse não memorizou, mesmo sendo dele) um curto poema escrito no guardanapo. Foi um momento engraçado, pois ele se esforçava para ler o que estava escrito – não decifrava sua própria letra! Sei como é isso, quando escrevo rápido, minha letra fica pior que letra de médico e nem eu entendo tudo de imediato.
Confesso que uma ou outra poesia eu não entendi muito bem. Senti a necessidade de ler e, assim, reler e refletir. Se eu tivesse anotado os títulos e seus autores, poderia procurar depois. Fico me xingando o tempo todo por não ter levado papel e caneta, justo eu que procuro sempre carregar essas ferramentas em determinados eventos. Um absurdo!
O encontro entre autores foi acima das minhas expectativas. Foi exatamente como o banner de divulgação do evento: “Versões é um projeto de curadoria compartilhada que promove o encontro e a crítica entre diversos escritores da literatura contemporânea brasileira. O SESC convida um autor que escolhe o trabalho de outro autor para comentar. As escolhas se interligam de forma a criar um panorama de nossa produção literária atual.”
Esse universo é muito interessante. Saber como funciona o processo criativo de cada um, seus preparativos, seus métodos, seus rituais e locais de trabalho, suas oficinas, desperta a curiosidade.
Marçal Aquino disse que, por gostar de ouvir a conversa alheia, o auxilia a escrever seus textos. Afirmou que não é bom para escrever diálogos, mas que presta muita atenção quando presencia certas conversas, apenas escutando, discretamente. Engraçado seu comentário de que adorava as linhas cruzadas no telefone, afinal a partir delas poderia sair algo para botar nos seus textos. Também falou que muitas vezes uma só palavra ou uma frase inspira a escrever. É dele o livro que peguei (correndo), na biblioteca do SESC, Cabeça a Prêmio. Provavelmente, vou comentar depois por aqui.
Também vou querer ler os livros dos outros escritores. Em breve, vou atrás do Cheiro do Ralo, de Lourenço Mutarelli. Esse inspirou um filme. Revi recentemente, e sei lá porque ainda não comentei no blog. Esse cara é uma figura. É um quadrinista conhecido (autor de Caixa de Areia, uma HQ simplesmente estupenda), mas se cansou dessa arte e resolveu se entregar de vez à literatura. Disse que escreve melhor com uma garrafa de bebida do lado e ouvindo música concreta o tempo todo. E que depois de participar do Cheiro do Ralo, como ator, e não como roteirista, descobriu mais essa veia artística e mergulhou de cabeça nesse ofício também.
Esse encontro durou três noites seguidas. Espero que tenha outras Versões, pois deixou a plateia com “gostinho de quero mais”. Sou tão guloso por esse tipo de evento que esse “gostinho” nunca vai cessar.
Márcio Luiz Soares
* * *
Ilustração de Juan Gris, Book, Pipe and Glasses (1915)
terça-feira, 11 de agosto de 2009
Raízes e asas
A época de seca na Austrália havia começado, e por isso todos os cangurus saíram da floresta e se encaminharam para próximo da cidade, em busca de comida. Num sábado ensolarado, depois de dias de caminhada, chegaram a um parque muito arborizado e por lá resolveram ficar.
Justine, uma fêmea acinzentada, estava feliz de ter encontrado um lugar tão bonito para morar. No dia seguinte, seu filhote completaria um ano e, sendo assim, ele finalmente poderia sair do marsúpio. Ela estava ansiosa para ver seu filhote correndo pelo gramado do parque, mas Jonny não estava nada nada animado.
- Nãããão, mãããe. Eu não quero ir. Eu quero ficar aqui pertinho de você - dizia o filhote.
- Mas meu amor, todos os cangurus, quando completam um ano, saem do marsúpio. Você já é grande: precisa conhecer o mundo, começar a se cuidar sozinho, fazer amigos. Eu vou estar por perto - respondia a carinhosa Justine.
- Nãããão, mãããe. Nãããão, mãããe, por favor - choramingava Jonny, que tremia só de pensar em sair do seu abrigo quente e seguro.
Mãe e filho estavam conversando sobre o assunto já fazia meses, mas Jonny estava irredutível. A última esperança da mãe canguru era de que seu filhote mudasse de ideia ao ver os primos brincando no parque. E resolveu não falar mais nada. Mas ela continuava com um aperto no coração. O que ela iria fazer se ele não mudasse mesmo de ideia?
Jonny, por sua vez, também estava com o coração apertado. À medida que anoitecia e se aproximava o momento de sair do marsúpio, mais ele se encolhia, só deixando os olhinhos para fora. Que conhecer o mundo que nada! Ele amava a mãe e não queria se afastar d...
- O que era aquilo? - se perguntou Jonny, sem nem conseguir completar o pensamento. - Que coisa liiinnda - exclamou, sem ar e boquiaberto.
Um garoto fazia bolinhas de sabão, que, com o reflexo da luz, ficavam coloridas. Até parecia que cada uma delas levava um arco-íris! Mas, de repente, ... puf puf puf puf puf. As bolhas estouraram e Jonny ficou ainda mais encantado com aquele mistério.
- Mããe, o que é...
Mais uma vez não deu tempo de Jonny terminar de falar. As bolhinhas de sabão invadiram de novo o céu, como delicadas bailarinas num palco gigantesco e azul. E, sem perceber de tão maravilhado, Jonny colocou as patinhas da frente para fora do marsúpio, tentando agarrar uma bolhinha que havia resolvido passar bem perto do seu nariz.
E a dança das bolhas continuava. Elas flutuavam e se espalhavam pelo ar.
- Eu preciso dançar com elas. Eu preciso dançar com elas - repetia o filhote, que, num impulso, pulou da bolsa e rodopiou leve no ar, como se ele próprio fosse uma bolha de sabão de rabo e patas.
Mas o vento levava suas companheiras de dança para cada vez mais longe, e mesmo saltando muito alto, Jonny não conseguiu mais se juntar a elas. E então, acenando para aqueles arco-íris flutuantes, Jonny gritou:
- Sejam feliiiizes!!
E sua Justine repetiu, apoiando as mãos no marsúpio vazio:
- Seja feliz, meu filho.
Justine, uma fêmea acinzentada, estava feliz de ter encontrado um lugar tão bonito para morar. No dia seguinte, seu filhote completaria um ano e, sendo assim, ele finalmente poderia sair do marsúpio. Ela estava ansiosa para ver seu filhote correndo pelo gramado do parque, mas Jonny não estava nada nada animado.
- Nãããão, mãããe. Eu não quero ir. Eu quero ficar aqui pertinho de você - dizia o filhote.
- Mas meu amor, todos os cangurus, quando completam um ano, saem do marsúpio. Você já é grande: precisa conhecer o mundo, começar a se cuidar sozinho, fazer amigos. Eu vou estar por perto - respondia a carinhosa Justine.
- Nãããão, mãããe. Nãããão, mãããe, por favor - choramingava Jonny, que tremia só de pensar em sair do seu abrigo quente e seguro.
Mãe e filho estavam conversando sobre o assunto já fazia meses, mas Jonny estava irredutível. A última esperança da mãe canguru era de que seu filhote mudasse de ideia ao ver os primos brincando no parque. E resolveu não falar mais nada. Mas ela continuava com um aperto no coração. O que ela iria fazer se ele não mudasse mesmo de ideia?
Jonny, por sua vez, também estava com o coração apertado. À medida que anoitecia e se aproximava o momento de sair do marsúpio, mais ele se encolhia, só deixando os olhinhos para fora. Que conhecer o mundo que nada! Ele amava a mãe e não queria se afastar d...
- O que era aquilo? - se perguntou Jonny, sem nem conseguir completar o pensamento. - Que coisa liiinnda - exclamou, sem ar e boquiaberto.
Um garoto fazia bolinhas de sabão, que, com o reflexo da luz, ficavam coloridas. Até parecia que cada uma delas levava um arco-íris! Mas, de repente, ... puf puf puf puf puf. As bolhas estouraram e Jonny ficou ainda mais encantado com aquele mistério.
- Mããe, o que é...
Mais uma vez não deu tempo de Jonny terminar de falar. As bolhinhas de sabão invadiram de novo o céu, como delicadas bailarinas num palco gigantesco e azul. E, sem perceber de tão maravilhado, Jonny colocou as patinhas da frente para fora do marsúpio, tentando agarrar uma bolhinha que havia resolvido passar bem perto do seu nariz.
E a dança das bolhas continuava. Elas flutuavam e se espalhavam pelo ar.
- Eu preciso dançar com elas. Eu preciso dançar com elas - repetia o filhote, que, num impulso, pulou da bolsa e rodopiou leve no ar, como se ele próprio fosse uma bolha de sabão de rabo e patas.
Mas o vento levava suas companheiras de dança para cada vez mais longe, e mesmo saltando muito alto, Jonny não conseguiu mais se juntar a elas. E então, acenando para aqueles arco-íris flutuantes, Jonny gritou:
- Sejam feliiiizes!!
E sua Justine repetiu, apoiando as mãos no marsúpio vazio:
- Seja feliz, meu filho.
Christiane Teixeira
***
Outra grande colaboração de Christiane Teixeira, com um texto muito sensível. Mais um que não podia ficar de fora deste espaço. Irresistível.
domingo, 9 de agosto de 2009
Apontamentos
Não é difícil ser atencioso e nem ter muitas virtudes.
É fácil ser honesto, muito mais consigo mesmo. Mesmo.
Acordar de madrugada, cheio de preocupação, é para qualquer um.
Para abraçar e acolher, basta querer ultrapassar a própria timidez. Ou a sisudez.
Ser frio, mas com o coração aflito, tem momento certo. Ou hora errada.
Pode ser difícil ser ouvido, quando orienta o caminho certo.
Fácil encontrar incertezas, naquele que precisa acreditar no que parece ser incerto.
A madrugada certamente passará a incomodar muito mais.
O abraço acolhedor e aconchegante é para sempre, porém, depende de quem se sentiu acolhido um dia. Ou todos os dias.
O coração aflito nunca sossega. Exceto na hora certa.
Mas hoje não é dia desses apontamentos de pai, apenas de comemoração.
É fácil ser honesto, muito mais consigo mesmo. Mesmo.
Acordar de madrugada, cheio de preocupação, é para qualquer um.
Para abraçar e acolher, basta querer ultrapassar a própria timidez. Ou a sisudez.
Ser frio, mas com o coração aflito, tem momento certo. Ou hora errada.
Pode ser difícil ser ouvido, quando orienta o caminho certo.
Fácil encontrar incertezas, naquele que precisa acreditar no que parece ser incerto.
A madrugada certamente passará a incomodar muito mais.
O abraço acolhedor e aconchegante é para sempre, porém, depende de quem se sentiu acolhido um dia. Ou todos os dias.
O coração aflito nunca sossega. Exceto na hora certa.
Mas hoje não é dia desses apontamentos de pai, apenas de comemoração.
Feliz Dia dos Pais para mim!
segunda-feira, 3 de agosto de 2009
Balada de agosto
Só isso: letra e música de dois mestres - Fagner e Zeca Baleiro. Pra começo, nem precisa mais.
Baleiro. Esse que também é o Cara. Também.
* * *
Balada de Agosto
Lá fora a chuva desaba e aqui no meu rosto
Cinzas de agosto e na mesa o vinho derramado
Tanto orgulho que não meço
O remorso das palavras
Que não digo
Mesmo na luz não há quem possa se esconder no escuro
Duro caminho o vento a voz da tempestade
No filme ou na novela
É o disfarce que revela o bandido
Meu coração vive cheio de amor e deserto
Perto de ti dança a minha alma desarmada
Nada peço ao sol que brilha
Se o mar é uma armadilha
Nos teus olhos
quarta-feira, 29 de julho de 2009
Pessoa
Foi um momento
O em que pousaste
Sobre o meu braço,
Num movimento
Mais de cansaço
Que pensamento,
A tua mão
E a retiraste.
Senti ou não?
Não sei. Mas lembro
E sinto ainda
Qualquer memória
Fixa e corpórea
Onde pousaste
A mão que teve
Qualquer sentido
Incompreendido,
Mas tão de leve!…
Tudo isto é nada,
Mas numa estrada
Como é a vida
Há uma coisa
Incompreendida…
Sei eu se quando
A tua mão
Senti pousando
Sobre o meu braço,
E um pouco, um pouco,
No coração,
Não houve um ritmo
Novo no espaço?
Como se tu,
Sem o querer,
Em mim tocasses
Para dizer
Qualquer mistério,
Súbito e etéreo,
Que nem soubesses
Que tinha ser.
Assim a brisa
Nos ramos diz
Sem o saber
Uma imprecisa
Coisa feliz.
Fernando Pessoa
* * *
Ilustração: "O chapéu do poeta Fernando Pessoa", de Costa Pinheiro, 1979 (óleo sobre tela)
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