sábado, 11 de abril de 2015

A humilhação



Do nada resolvi voltar. Assim como foi do nada que dei um tempo disto aqui. Mas não foi do nada que decidi resenhar, ou simplesmente indicar, um livro que gostei muito. Me deu aquela vontade de registrar e de compartilhar que, desta vez, não foi possível resistir. Espero não resistir outras vezes.

***

Tudo acabou para Simon Axler, o protagonista do surpreendente A humilhação, de Philip Roth. Um dos principais atores de teatro norte-americanos de sua geração, agora na casa dos sessenta, ele perdeu o seu talento, a sua magia em interpretar personagens marcantes que "são derretidos no ar." Agora, no palco ele se sente como um lunático, se sente como um idiota. Sua confiança em seus poderes foi drenada; ele imagina as pessoas rindo dele; ele não pode mais fingir ser outra pessoa. "Algo fundamental desapareceu." Sua esposa se ​​foi, sua audiência o deixou, o seu agente não pode convencê-lo a fazer um retorno. 

Aos poucos, vê sua vida sendo estilhaçada. Abandonado e sozinho, ele habita um estranho e triste mundo de saudade e arrependimento, tendo adiante um infindável crepúsculo. No entanto, inexplicavelmente ou não, diante de uma terrível auto-avaliação, estoura um desejo erótico incomum, nada mais que um consolo para uma vida que, conforme tudo indicava, seguiria dali pra frente desprovida de riscos, cheia de desconforto e insatisfação - provavelmente tudo culminaria para um fim ainda mais escuro, mais trágico e mais chocante.

Nesta jornada, o leitor acompanha essa degradação não como se lesse um romance, mas um longo conto. E foi com esta sensação que me vi diante de um personagem que tem urgência em se sentir vivo, que sente sua bravura se esvaindo, mas sem ter a certeza de que a possuía. No final de sua vida, o artista olha para trás, reavalia temas antigos com um novo olhar. Apesar de o material obter outra espessura, mais delgada, é submetido a novos processos de destilação, oferecendo um líquido bem mais denso no alambique da consciência retrospectiva. O sabor nem sempre é agradável.

Enfim, o autor nos convence, sem muito esforço, que a velhice diminui a nossa solidez, nossos talentos, nossa reputação, nossas performances de vida, de amor e de sexo, assim como a esperança. Tudo é gradativamente removido. Para uns mais lentamente, para outros mais rapidamente. Alguns sentem o baque. Outros fingem não sentir.


Márcio Luiz Soares

Nenhum comentário: