quarta-feira, 31 de dezembro de 2008

Recomeçar



Aproveitando que vou passar o reveillon na região de Campinas (mais uma vez!) decidi fazer a última postagem do ano num dia que antecede o dia que mais gosto depois do meu aniversário - o 1º dia do ano. Nem eu entendo bem essa minha grande admiração, essa minha vontade de querer curtir a passagem do ano ao máximo, madrugando, bebendo, comendo, brincando de Imagem & Ação, entre outras atividades que me mantém acordado!

Como recebi diversas mensagens bonitas, profundas, interessantes e positivas, achei que postar uma delas seria bacana. Dureza me decidir! Optei por duas que me sensibilizaram um pouco mais, traduzindo muita coisa que penso e desejo. Coincidentemente, as duas escolhidas me foram enviadas por duas amigas que se chamam Cláudia.

A primeira mensagem é da Ana Cláudia Geremias - um texto recheado de coisas positivas e inspiradoras. Também inspiradora foi a letra de uma música do Frejat que a Cláudia Rovani enviou em forma de mensagem de final de ano – gostei da idéia! E claro que postei o clipe da música. Aliás, dois clipes que encontrei no Youtube. O primeiro é o oficial do cantor. O outro achei tão bacaninha que eu não quis deixar de fora.

A postagem ficou longa, mas vale a pena, pois transmite tudo que a gente precisa ouvir, falar, ver, perceber, enfim ter atitude, e assim fazer com que 2009 seja melhor, diferente. Depende de nossa vontade pra mudar, de ousar e de tentar ser mais feliz.


* * *

O NOVO ANO Em menos de um dia estaremos no último dia do ano de 2008...

E depois da meia-noite, virá o Ano Novo... O engraçado é que - teoricamente - continua tudo igual... Ainda seremos os mesmos. Ainda teremos os mesmos amigos.

Alguns estarão no mesmo emprego.

O mesmo parceiro ou parceira.

As mesmas dívidas (emocionais e/ou financeiras).

Ainda seremos fruto das escolhas que fizemos durante a vida.

Ainda seremos as mesmas pessoas que fomos este ano...

A diferença, a sutil diferença, é que quando o relógio nos avisar que é meia-noite, do dia 31 de dezembro de 2008, teremos um ano in-tei-ri-nho pela frente!

Um ano novinho em folha!

Como uma página de papel em branco, esperando pelo que iremos escrever.

Um ano para começarmos o que ainda não tivemos força de vontade, coragem ou fé...

Um ano para perdoarmos um erro, um ano para sermos perdoados dos nossos...

365 dias para fazermos aquilo que quisermos...

Ou para deixarmos que façam o que quiserem conosco... Sempre há uma escolha...


E, exatamente por isso, eu desejo que os meus amigos façam as melhores escolhas que puderem.


Desejo que sorriam o máximo que puderem.

Cantem aquilo que quiserem.

Beijem muito.

Amem mais.

Abracem bem apertado. Durmam com os anjos.

Sejam protegidos por eles.

Agradeçam por estarem vivos e terem sempre

mais uma chance para recomeçar. Agradeçam as suas escolhas, pois certas ou não, elas são suas.

E ninguém pode ou deve questioná-las. E eu gostaria de agradecer aos amigos que eu tenho.

Aos que me 'acompanham' desde muito tempo.

Aos que eu fiz este ano. Aos que eu escrevo pouco, mas lembro muito. Aos que eu escrevo muito e falo pouco.

Aos que moram longe e não vejo tanto quanto gostaria.

Aos que moram perto e eu vejo sempre.

Aos que me 'seguram', quando penso que vou cair.

Aos que eu dou a mão, quando me pedem ou quando me parecem um pouco perdidos.

Aos que ganham e perdem.

Aos que me parecem fortes e aos que realmente são.

* * *

Amor pra recomeçar

Eu te desejo não parar tão cedo
Pois toda idade tem prazer e medo
E com os que erram feio e bastante
Que você consiga ser tolerante
Quando você ficar triste
Que seja por um dia, e não o ano inteiro
E que você descubra que rir é bom
Mas que rir de tudo é desespero
Desejo que você tenha a quem amar
E quando estiver bem cansado
Ainda exista amor pra recomeçar
Pra recomeçar
Eu te desejo muitos amigos
Mas que em um você possa confiar
E que tenha até inimigos
Pra você não deixar de duvidar
Quando você ficar triste
Que seja por um dia, e não o ano inteiro
E que você descubra que rir é bom
Mas que rir de tudo é desespero
Desejo que você tenha a quem amar
E quando estiver bem cansado
Ainda exista amor pra recomeçar
Pra recomeçar
Eu desejo que você ganhe dinheiro
Pois é preciso viver também
E que você diga a ele, pelo menos uma vez
Quem é mesmo dono de quem
Desejo que você tenha a quem amar
E quando estiver bem cansado
Ainda exista amor pra recomeçar
Pra recomeçar



terça-feira, 30 de dezembro de 2008

Saber viver






Dizem que a vida é curta, mas não é verdade.

A vida é longa para quem consegue viver pequenas felicidades. E essa tal felicidade anda por ai, disfarçada, como uma criança traquina brincando de esconde-esconde. Infelizmente às vezes não percebemos isso e passamos nossa existência colecionando nãos: a viagem que não fizemos o presente que não demos, a festa que não fomos, o amor que não vivemos, o perfume que não sentimos.

A vida é mais emocionante quando se é ator e não espectador; quando se é piloto e não passageiro; pássaro e não paisagem; cavaleiro e não montaria. E como ela é feita de instantes, não pode nem deve ser medida em anos ou meses, mas em minutos e segundos.

Esta mensagem é um tributo ao tempo. Tanto aquele tempo que você soube aproveitar no passado quanto aquele tempo que você não vai desperdiçar no futuro. Porque a vida é agora...

Não tenha medo do futuro, apenas lute e se esforce ao máximo para que ele seja do jeito que você sempre desejou. A morte não é a maior perda da vida.
"A maior perda da vida é o que morre dentro de nós enquanto vivemos."

* * *

Esse texto foi enviado pelo meu amigo Marcello Blanc. Ele desconhece a autoria. Pesquisou mas encontrou vários autores diferentes. De qualquer forma, independente de quem seja o autor, o texto é muito sensível e profundo.

Depois que caí na real, já há muitos anos, decidi que não apenas veria a vida passar, sentar no camarote e aconteça o que acontecer, ficando inerte. Assim como também não deixo de alimentar meus sonhos e de tentar concretizá-los.

Também tenho consciência de que por diversos momentos somos meros espectadores sim, que a vida nos leva por caminhos que não escolhemos, no entanto não se deve deixar que isso seja constante, assistir a tudo passivamente - afinal é a nossa vida. E por essas e outras que, quando não estou dando um certo rumo para minha vida, nas minhas horas vagas eu procuro fazer as coisas que gosto, que me dão prazer, sem deixar de compartilhar esses prazeres, o máximo possível, com as pessoas com as quais eu convivo. É assim que busco os meus instantes de felicidade. E de bem com a vida.

domingo, 28 de dezembro de 2008

O Amor bate na aorta



Cantiga do amor sem eira
nem beira,
vira o mundo de cabeça
para baixo,
suspende a saia das mulheres,
tira os óculos dos homens,
o amor, seja como for,
é o amor.

Meu bem, não chores,
hoje tem filme de Carlito!

O amor bate na porta
o amor bate na aorta,
fui abrir e me constipei.
Cardíaco e melancólico,
o amor ronca na horta
entre pés de laranjeira
entre uvas meio verdes
e desejos já maduros.

Entre uvas meio verdes,
meu amor, não te atormentes.
Certos ácidos adoçam
a boca murcha dos velhos
e quando os dentes não mordem
e quando os braços não prendem
o amor faz uma cócega
o amor desenha uma curva
propõe uma geometria.

Amor é bicho instruído.
Olha: o amor pulou o muro
o amor subiu na árvore
em tempo de se estrepar.
Pronto, o amor se estrepou.
Daqui estou vendo sangue
que escorre do corpo andrógino.
Essa ferida, meu bem,
às vezes não sara nunca
às vezes sara amanhã.
Daqui estou vendo o amor
irritado, desapontado,
mas também vejo outras coisas:
vejo corpos, vejo almas
vejo beijos que se beijam
ouço mãos que se conversam
e que viajam sem mapa.
Vejo muitas outras coisas
que não ouso compreender...


Carlos Drummond de Andrade

sábado, 27 de dezembro de 2008

Fome e sede





Fome e sede
Motivos sem fim

Indivíduos diversos e divergentes

Todos:
O estresse se vai, sem forçar
A fome nem sempre é de comida
É de gente, de ambiente, de visual, de palavras
E de ouvidos

Alguns:
A sede sempre vem acompanhada
De querer e se ter, e do que precisa
Com ou sem álcool
De olhos e ouvidos, mesmo que pense que não

Uns e outros:
O olhar pode ser furtivo, mais gostoso pode ficar
Os gestos denunciam, mais que a boca que não é vista
Mais que os olhos que não querem fingir
E mais denúncias
Nem sempre perdidas, nem sempre satisfeitas
Fome e sede

Que a procura não seja em vão:
Saciar um vício
O vício de todos, de alguns, de uns e outros
Os motivos são os mesmos, e provocantes
Alegrias, envolvimentos, prazeres
Assim como os encontros e desencontros
Os encontros podem ser individuais
Basta que se aproveite, e se deixe, e se tenha
Os desencontros, ninguém quer lembrar
Nunca individuais
Os motivos continuam os mesmos, vá lá
Fome e sede
E um sem fim de bares para te provar
Ou provar

Muitos bares e um pode ser único

Abandonar os demais, jamais
A escolha é honesta
Depende do encontro e da descoberta

Sempre tem um, apenas um, que é você
Os motivos estarão sempre lá, te esperando
Fome e sede
Sem fim

Márcio Luiz Soares

* * *

Nesta data o Zin’Bar, o meu bar preferido, está se despedindo do atual local, motivo pelo qual fiz esta postagem. Não poderia ser diferente, pois foi nele que este blog criou vida. A humilde poesia foi como uma homenagem ao bar que freqüentei desde a sua inauguração, há mais de três anos. Quanto estresse da faculdade, ou do trabalho, ou da vida, não deixei no fundo de um copo vazio! Principalmente numa taça de vinho tinto! Quantas pessoas que gosto dividiu uma mesa comigo! Quantas vezes não abri meus ouvidos e meu coração por ali! Ele em breve se mudará para outro local maior. Espero que tenha o mesmo charme que me cativou. Motivos para ele ser o meu bar preferido são muitos. Depois que se escolhe o preferido, e ele se despede de nós, a fome e a sede continua - o vazio também.

domingo, 30 de novembro de 2008

Encostar na Ana




Eu não tenho dúvidas de que “o Brasil é um país de cantoras”. Mesmo que essa afirmação possa ter se tornado um clichê, ela é muito verdadeira. Tenho uma lista enorme de cantoras nacionais das quais sou fã. Espero postar alguma coisinha de cada uma delas por aqui. Na verdade, o país vai muito bem de cantoras, de cantores, de músicos e de compositores, obrigado.

Ana Carolina é considerada uma das melhores compositoras e cantoras. Eu estava escutando no meu carro o álbum Perfil e quando cheguei em casa coloquei o clipe da música Encostar na Tua (o mesmo que postei aqui), que pertence ao mesmo álbum. Sempre que ouço essa canção, sempre que assisto ao clipe eu me emociono. Não somente com esta canção – com todas. Porém, ela tem algo a mais para mim. Toca bem fundo. Revolve as areias do tempo.

Acredito que pra muita gente esta música pega no coração, mexe com qualquer um. Outras também, pois a Ana Carolina diz verdades avassaladoras e absolutas em suas letras. Mesmo quando a letra não é dela, é claro. Ela tem uma maneira peculiar de cantar, carrega com tanto sentimento, com tanta emoção – uma emoção que cutuca, diverte, entristece, incomoda, invade, desmistifica, nos desconstroi. Às vezes, assusta. Preste atenção em suas letras e como ela canta. Vai me entender.

Assim como vai me entender se prestar atenção quando ela diz “Eu quero te roubar pra mim / Eu que não sei pedir nada”. Também tem outro trecho que merece mais atenção: "Eu só quero saber em qual rua / Minha vida vai encostar na tua.” Não. Esquece. Preste atenção na letra toda, isso sim!


Eu quero te roubar pra mim
Eu que não sei pedir nada
Meu caminho é meio perdido
Mas que perder seja o melhor destino

Agora não vou mais mudar
Minha procura por si só
Já era o que eu queria achar
Quando você chama meu nome
Eu que também não sei aonde estou
Pra mim que tudo era saudade
Agora seja lá o que for

Eu só quero saber em qual rua
Minha vida vai encostar na tua

Eu só quero saber em qual rua
Minha vida vai encostar na tua

Eu quero te roubar pra mim
Eu que não sei pedir nada
Meu caminho é meio perdido
Mas que perder seja o melhor destino

Agora não vou mais mudar
Minha procura por si só
Já era o que eu queria achar
Quando você chama meu nome
Eu que também não sei aonde estou
Pra mim que tudo era saudade
Agora seja lá o que for

Eu só quero saber em qual rua
Minha vida vai encostar na tua

Eu só quero saber em qual rua
Minha vida vai encostar na tua

E saiba que forte eu sei chegar
Mesmo se eu perder o rumo
E saiba que forte eu sei chegar
Se for preciso eu sumo

Eu só quero saber em qual rua
Minha vida vai encostar na tua

Eu só quero saber em qual rua
Minha vida vai encostar na tua

Eu quero te roubar pra mim...



sábado, 29 de novembro de 2008

A Morte conta uma história





Gosto muito de ler. Sou apaixonado por livros, entretanto considero que perdi muito tempo não lendo os livros que já deveria ter lido, como diversos clássicos da literatura internacional. Ou seja, acho que li pouco. Mesmo concordando que leio mais que a média nacional. Apesar da paixão pelos livros, apesar da minha idade, apesar do meu grande interesse por esse universo fantasticamente mágico e inebriante, considero que li muito pouco. Existem diversos autores muito interessantes que o mundo todo já leu e eu não, ou que li poucos títulos – portanto a minha lista “os livros que quero ler” é extensa. Muito, muito extensa. Aos poucos vou dando conta. Não comecei tarde, apenas dividi demais os meus afazeres e, durante determinadas épocas, prejudiquei o meu espaço para leitura de livros. Mesmo não tendo lido a quantidade de livros que gostaria, considero ter feito as escolhas certas, ou simplesmente dei sorte. Gosto principalmente dos livros que apresentam uma narrativa poética. Por isso acertei mais uma vez, pois A menina que roubava livros possui essa narrativa - extremamente inteligente, devo salientar. Não é sempre que encontro textos assim, ainda mais quando é de uma poética tão bem-humorada, com pinceladas sarcásticas muito bem colocadas (nem sempre sutis) e tão refinada. Reverências ao escritor australiano Markus Zusak.

Zusak conseguiu juntar revolta, tristeza, alegria, desejo, dor, enfim muita emoção, de uma maneira poética, sem abstracionismo exarcebado, sem jocosidade e, o que é muito melhor, sem ser piegas. Ao longo da leitura nos vemos jogados nesse misto de emoção, ora nos revoltamos, ora ficamos apreensivos, ora nos alegramos e nos divertimos. Exatamente como é o nosso mundo, como sempre nos acontece, mas com um detalhe: nas nossas vidas falta a poesia. Somente quando a narramos com todos os nossos sentimentos aflorados, aí sim a acrescentamos – mesmo quem não tem o domínio literário. Até pode fazer parte da nossa vida real, numa contemplação da natureza, num momento de introspecção, numa declaração de amor e paixão, mas não a percebemos facilmente. E nem precisa. Basta ela influenciar o momento. Como influencia no livro.

Antes de terminar a leitura do livro, eu relia incansavelmente diversos capítulos. Não foi por não ter entendido. Relia para voltar a saborear as palavras, as entrelinhas, as contexturas, os comentários, irônicos ou não, habilmente intercalados. Aliás, essa tarefa de comentar coube a narradora da história: a Morte. É ela que retrata as dores e perdas causadas pelo nazismo durante a Segunda Guerra Mundial (reclamando de todo o trabalho que teve nesse período da história), assim como a importância de sua existência, tentando entender a natureza humana, e é por meio dela que o leitor é levado a se emocionar ao lado da personagem Liesel Meminger (por quem a Morte é totalmente fascinada), diante de seus anseios, angústias, misérias, tristezas, alegrias e aventuras.

Liesel é levada a ter uma vida que não desejava após a morte do seu irmão. E foi justamente durante o enterro dele que ela se depara diante da oportunidade de roubar um livro. Obrigada a morar com pais adotivos são nos livros furtados que ela encontra as palavras que a guiam - não servem apenas de distração, provocam um vislumbre de esperança de uma vida melhor. Outras coisas também a guiariam e marcariam sua vida, como a amizade de Rudy, seu amigo de aventuras, o afeto pelo seu pai adotivo, Hans, e a compaixão e ternura com Max, um fugitivo judeu. Com todos eles a acompanhamos nas cores da sua vida, nas descobertas de caráter e de personalidade, permeados por sentimentos nobres que a cumplicidade mútua é capaz de provocar. A menina Liesel era cúmplice de cada um deles, na dor, na alegria, na esperança, na luta pela sobrevivência, no refúgio de si mesmos.

Encontrei nesse livro audacioso, uma história ao mesmo tempo triste e divertida, envolvente, surpreendente, repleta de metáforas e simbolismos, tendo como grande sacada o fato de ser contada pela Morte. [Em setembro, postei aqui um capítulo do livro, intitulado Diário da Morte - recomendo uma espiada.] Numa versão em que a Morte tem coração, se sensibiliza, capaz de sentir ternura e carinho pelas vítimas da destruição e da crueldade humana, fica revoltada e indignada com os extremos do ser humano e, apesar de tudo, ela nos fornece uma definição da grandiosidade dele.

Gostei do estilo do autor, não somente pela prosa poética, mas também pela proeza narrativa em uni-la linguisticamente nas entrelinhas permeadas de humor, emoção, tomando o cuidado de não colocar o mistério em primeiro plano – uma inovação, tendo em vista que a enorme maioria dos escritores mantém o suspense até o último capítulo. O suspense existe no livro, não da forma que estamos acostumados, na busca da decifração de um enigma encontrada somente no final, e sim por estar inserido num contexto mais profundo, numa narração que encanta e surpreende o tempo todo, incitando-nos a seguir em frente, não apenas por curiosidade simplesmente, mas por necessidade de querer acompanhar a Liesel. Dessa forma o leitor tem a chance de valorizar a narração, reconhecer sua riqueza e atingir um nível de satisfação incondicional durante a leitura.

Quando terminei de ler o livro, cheguei a diversas conclusões. A principal foi justamente a mais óbvia: a vida, apesar de tudo, vale a pena.


Márcio Luiz Soares

***
Foto: by Márcio Luiz Soares (arquivo pessoal)

quarta-feira, 26 de novembro de 2008

O que há





O que há em mim é sobretudo cansaço -
Não disto nem daquilo,
Nem sequer de tudo ou de nada:
Cansaço assim mesmo, ele mesmo,
Cansaço.

A subtileza das sensações inúteis,
As paixões violentas por coisa nenhuma,
Os amores intensos por o suposto alguém.
Essas coisas todas –
Essas e o que faz falta nelas eternamente -;
Tudo isso faz um cansaço,
Este cansaço,
Cansaço.

Há sem dúvida quem ame o infinito,
Há sem dúvida quem deseje o impossível,
Há sem dúvida quem não queira nada –
Três tipos de idealistas, e eu nenhum deles:
Porque eu amo infinitamente o finito,
Porque eu desejo impossivelmente o possível,
Porque eu quero tudo, ou um pouco mais, se puder ser,
Ou até se não puder ser...

E o resultado?
Para eles a vida vivida ou sonhada,
Para eles o sonho sonhado ou vivido,
Para eles a média entre tudo e nada, isto é, isto...
Para mim só um grande, um profundo,
E, ah com que felicidade infecundo, cansaço,
Um supremíssimo cansaço,
Íssimo, íssimo, íssimo,
Cansaço...


Álvaro de Campos

terça-feira, 25 de novembro de 2008

Somos livres?





Somos livres. Esta frase pode parecer muito abstrata hoje diante do cotidiano atropelado de afazeres, atividades, responsabilidades que todas as pessoas têm. Ninguém tem tempo de pensar na questão de “ser livre” e esta falta de tempo parece ser a prova de que a liberdade não existe. Quem, ao trabalhar demais, sem poder realizar outros aspectos de sua vida (como o conhecimento que envolve leituras, filmes, boas conversas, até mesmo a possibilidade de freqüentar cursos, de fazer viagens, de desenvolver sua criatividade, de aprender, enfim, coisas novas), pode dizer que é livre?

Lazer é o nome que damos a tudo isso que constantemente nos falta. O lazer não é algo que podemos abandonar em nome do trabalho. Em geral, é o que deixamos de lado quando estamos na luta pela sobrevivência. Mas é o nosso lazer que nos ensina e nos prepara para sermos seres humanos melhores, mais elaborados, inclusive no trabalho e, sobretudo, em relação a nossa família e amigos. É neste mundo que recarregamos nossas energias para os esforços que temos que fazer em nosso dia a dia.

Onde entra a liberdade neste caso? O lazer não é só um pacto que fazemos com a liberdade, mas a chance de expandi-la para todas as esferas da nossa vida. Liberdade é o nome que se dá ao fato de que escolhemos nossos rumos. Se não escolhemos não somos livres. O fato de que não temos tempo para o lazer prova que não temos liberdade. Ou que não sabemos usá-la. Uma parte da vida se perde aí. O problema maior da liberdade é que a vida também pode ficar meio sem sentido quando não pensamos no que estamos fazendo com ela. A liberdade é, portanto, mais do que algo que se tem ou não se tem, que se sabe ou não se sabe usar. Ela é uma capacidade de pensar na própria vida e de optar de modo responsável pelas próprias escolhas.

A liberdade é algo que faz parte do ser humano. Ninguém pode sentir que se tornou um ser humano sem que tenha tomado a liberdade como algo seu. Esta é uma idéia que vem de não muito tempo atrás. É uma idéia moderna que apareceu junto com o desejo humano que cada indivíduo tem de ter posse sobre si mesmo. Liberdade não é apenas algo que nos limita desde que pensamos que a de um termina onde começa a de outro. É mais que isso. Liberdade é a capacidade de organizar a vida para que trabalho e lazer possam ser possíveis. Mas, sobretudo, é ter consciência de si dentro destas dimensões da vida.


Márcia Tiburi


sábado, 22 de novembro de 2008

A globalização é uma mulher



Ontem, a ordem unida; hoje, as muitas possibilidades.
Ontem, a luta por ser melhor; hoje, por ser singular.
Ontem, o falar grosso; hoje, o falar carinhoso.
Ontem, a razão dos números; hoje, a do afeto.
Ontem, o poder do pai; hoje, o da família.
Ontem, o amor disciplinado; hoje, o amor responsável.
Ontem, o treinamento; hoje, a experiência.
Ontem, o futuro previsível; hoje, o futuro inventado.
Ontem, a rebeldia; hoje, a diferença.
Ontem, o como chegar; hoje, o como escolher.
Ontem, o necessário; hoje, o desejável.
Ontem, o importante; hoje, o entusiasmo.
Ontem, a universalização masculina; hoje, a globalização feminina.


Jorge Forbes

terça-feira, 4 de novembro de 2008

Gato que brincas na rua



Gato que brincas na rua
Como se fosse na cama,
Invejo a sorte que é tua
Porque nem sorte se chama.

Bom servo das leis fatais
Que regem pedras e gentes,
Que tens instintos gerais
E sentes só o que sentes.

És feliz porque és assim,
Todo o nada que és é teu
Eu vejo-me e estou sem mim,
Conheço-me e não sou eu.


Fernando Pessoa


***
Atendendo a pedidos, postei a poesia na íntegra (publiquei apenas um trecho no mês passado - era só o que eu tinha! rs). Duas colaboradoras merecem meu agradecimento pelo grande auxílio prestado ao enviarem o texto completo: Margareth e Kátia. Brigadão, meninas!

quinta-feira, 30 de outubro de 2008

As Palavras






As palavras são boas. As palavras são más. As palavras ofendem. As palavras pedem desculpas. As palavras queimam. As palavras acariciam. As palavras são dadas, trocadas, oferecidas, vendidas e inventadas. As palavras estão ausentes.

Algumas palavras sugam-nos, não nos largam... As palavras aconselham, sugerem, insinuam, ordenam, impõem, segregam, eliminam. São melífluas ou azedas. O mundo gira sobre palavras lubrificadas com óleo de paciência. Os cérebros estão cheios de palavras que vivem em boa paz com as suas contrárias e inimigas. Por isso as pessoas fazem o contrário do que pensam, julgando pensar o que fazem. Há muitas palavras.

E há os discursos, que são palavras encostadas umas às outras, em equilíbrio instável graças a uma precária sintaxe, até ao prego final do disse ou tenho dito. Com discursos se comemora, se inaugura, se abrem e fecham sessões, se lançam cortinas de fumo ou dispõem bambinelas de veludo. São brindes, orações, palestras e conferências. Pelos discursos se transmitem louvores, agradecimentos, programas e fantasias. E depois as palavras dos discursos aparecem deitadas em papéis, são pintadas de tinta de impressão - e por essa via entram na imortalidade do verbo. E as palavras escorrem tão fluidas como o "precioso líquido". Escorrem interminavelmente, alagam o chão, sobem aos joelhos, chegam à cintura, aos ombros, ao pescoço. É o dilúvio universal, um coro desafinado que jorra de milhões de bocas. A terra segue o seu caminho envolta num clamor de loucos, aos gritos, aos uivos, envoltos também num murmúrio manso, represo e conciliador...

E tudo isso atordoa as estrelas e perturba as comunicações, como as tempestades solares. Porque as palavras deixaram de comunicar. Cada palavra é dita para que se não ouça outra palavra. A palavra, mesmo quando não afirma, afirma-se. A palavra não responde nem pergunta: amassa. A palavra é a erva fresca e verde que cobre os dentes do pântano. A palavra é poeira nos olhos e olhos furados. A palavra não mostra. A palavra disfarça. Daí que seja urgente moldar as palavras para que a sementeira se mude em Seara. Daí que as palavras sejam instrumento de morte - ou de salvação. Daí que a palavra só valha o que valer o silêncio do ato.

Há também o silêncio. O silêncio, por definição, é o que não se ouve. O silêncio escuta, examina, observa, pesa e analisa. O silêncio é fecundo. O silêncio é a terra negra e fértil, o húmus do ser, a melodia calada sob a luz solar. Caem sobre ele as palavras. Todas as palavras. As palavras boas e as más. O trigo e o joio. Mas só o trigo dá pão.


José Saramago, do livro de crônicas Deste Mundo e do Outro
[Ilustração: The wall of no-words, de Alberto G. Baccelli]

sábado, 25 de outubro de 2008

Vôo






Alheias e nossas, as palavras voam.
Bando de borboletas multicores, as palavras voam
Bando azul de andorinhas, bando de gaivotas brancas,
as palavras voam.
Voam as palavras como águias imensas.
Como escuros morcegos como negros abutres, as palavras voam.
Oh! alto e baixo em círculos e retas acima de nós,
em redor de nós as palavras voam.
E às vezes pousam.



Cecília Meireles

sábado, 18 de outubro de 2008

Sonho Real





Imaginação à flor da pele
Um mundo surreal
Discos voadores passam
Terrestres amáveis
Em paz.

Crianças sem medo
Jornal sem sangue
As grades, os muros, lembranças.

Novos dicionários
Sem palavras vermelhas
Sem linhas imaginárias
Sem dúvidas cruéis.

Eu
Você
Todos vivendo um único sonho
Um sonho de paz.

Passa um homem
Sorrindo, acenando
Verdade no olhar
Sem medo, rimos juntos.

Sinto um toque.
De olhos abertos
Vejo você.

A realidade me volta
Nua, crua e única
Finalmente,
Entrego-me inteira
Ao destino, à vida
A esse sonho tão real.


Kátia Martins



quinta-feira, 9 de outubro de 2008

Ao mar





Como é longa essa viagem de volta. Os fins de tarde sobre o mar e essa passagem do sol poente à lua são os únicos momentos em que sinto o coração mais leve. Terei sempre amado o mar. Ele terá sempre apaziguado tudo dentro de mim.

Terrível mediocridade deste meio. Até agora não me sujeitei uma única vez à mediocridade que podia me cercar. Até agora. Mas aqui essa intimidade vai longe demais. E em todos, ao mesmo tempo, esse algo que poderia ir longe, se apenas...

Dois seres jovens e belos começaram um idílio neste navio, e logo uma espécie de círculo mau fechou-se a sua volta. Esses começos do amor! Eu os amo e aprovo do fundo do coração - até mesmo com uma espécie de gratidão pelos que preservam, neste convés, no meio do Atlântico reluzente de sol, a meio caminho de continentes loucos, essas verdades que são a juventude e o amor. Mas por que não chamar pelo nome também essa inveja que sinto no coração e o desejo tumultuado que se apodera de mim no sentido de redescobrir o coração impaciente que eu tinha aos vinte anos. Mas conheço o remédio, vou olhar para o mar durante muito tempo.

Tristeza por me sentir ainda tão vulnerável. Daqui a 25 anos, terei 57. Portanto, 25 anos para fazer minha obra e encontrar o que procuro. Depois, a velhice e a morte. Sei qual é o mais importante para mim. E encontro, ainda, meio de ceder às pequenas tentações, de perder tempo em conversas vãs ou passeios estéreis. Dominei duas ou três coisas em mim. Mas como estou longe dessa superioridade de que tanto necessito.

Maravilhosa noite sobre o Atlântico. Essa hora que vai do sol desaparecido à lua apenas nascente, do oeste ainda luminoso ao leste já escuro. Sim, amei muito o mar - essa imensidão calma - esses sulcos recobertos - essas estradas líquidas. Pela primeira vez, um horizonte à altura de uma respiração de homem, um espaço tão vasto quanto sua audácia. Sempre estive dilacerado entre meu apetite pelos seres, a vaidade da agitação e o desejo de me tornar igual a esses mares de esquecimento, a esses silêncios desmedidos, que são como o encantamento da morte. Tenho o gosto das vaidades do mundo, dos meus semelhantes, dos rostos, mas, fora do meu tempo, tenho uma regra própria, que é o mar e tudo que se lhe assemelha neste mundo.

Ó suavidade das noites, em que todas as estradas oscilam e deslizam por cima dos mastros, e esse silêncio em mim, esse silêncio, afinal, que me liberta de tudo.


Albert Camus

* * *

Este é um trecho do livro que acabei de ler, Diário de Viagem. Gosto das obras de Camus, um pensador conhecido como o filósofo do absurdo. Espero poder comentar sobre seus livros neste espaço. Se nunca leu nada dele, sugiro que não começe pelo Diário de Viagem. Justamente por ser bem intimista.


segunda-feira, 6 de outubro de 2008

quinta-feira, 2 de outubro de 2008

O rádio





O rádio

Estação 1
Cheiro de café e da farda do colégio passada a ferro.
O locutor diz que a libriana amiga terá um ótimo dia.
Céu limpo, sol morno.
E o refrão:
Sociedade, Salvador, Bahia.

Estação 2
Reinaldo Fontes diz bom dia no rádio da cozinha.
Marinalva suspira com a voz grave de seu companheiro matinal.
O galã deve ser alto, bom partido e deve gostar de cinema.
Na próxima promoção “Almoce com o Reinaldo”,
Ela não poderá errar o nome da música.

Estação 3
E agora que a verdade entra em sua casa, amiga ouvinte,
Salve sua família, salve sua alma.
Deixe Deus operar em sua vida.
Pare de sofrer!!!!

Estação 4
No fogo, o arroz fumegante está quase pronto.
O rádio irrequieto não se decide,
Movido a dedos nervosos.
Ah aquela música que não vem...

Estação 5
A cortina branca é jogada para o alto.
A porta é empurrada pela brisa.
João Gilberto canta,
Sopradamente, dolentemente,
Sobre o silêncio dos móveis.

Estação 6
Chiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiziumzium
Chiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiii


Paula Dórica

sábado, 27 de setembro de 2008

Razões






Eu sempre me achei bonitinha. Assim mesmo, no diminutivo. Na adolescência queria encantar meninos e meninas. Encantava os meninos para ganhar uns beijinhos, uns "amassos". Sempre gostei de beijar. As meninas eu nunca consegui encantar devidamente. Não como eu gostaria. Tinha poucas amigas. Amigas de verdade. Coleguinhas não valiam. Sei que algumas se aproximavam de mim porque sempre havia meninos por perto. Sempre sobravam coisas boas para elas. Não que eu dispensasse. Nem era preciso. Surgiam em bandos. Quem eu queria que fosse minha amiga, tomava distância. O tempo me mostrou o motivo. Um determinado jeitinho vulgar que demorei abandonar. As amizades artificiais foi o que me sobrou. Aproveitei como pude. Sem nulidades.

Cresci muito rápido. O corpo superou a inteligência. Os desejos muito mais. Os diversos pares de pernas na areia jogando futebol colaboraram. O par menos atraente sempre ficava por perto. Jorge. Gostava de ver como ele desviava o olhar quando eu o flagrava. Era divertido. Tanto quanto me fazer de bobinha. Ele era muito mais. Nunca percebeu que eu seria fácil. Seu amiguinho, Laerte, sempre foi mais audacioso. Fingia que não notava meus olhares. Numa festa de aniversário de Jorge, deixou de fingir durante um tempo. O tempo de uma brincadeira, um jogo. Foi o suficiente para eu perceber que ele queria tudo. De todos. Para si. Foi o que mais me atraiu. Ambição e obstinação num homem me atraem. Razão do meu fracasso.

Laerte me teve o tanto que quis. Na adolescência foi menos. Quanto mais amadurecia, mais me dominava. Mais eu fracassava. Sem ter consciência disso. Hoje tenho de sobra. Consciência. Fracassos se foram. Desilusões não. Minha eterna sina. Talvez.

A primeira veio de Laerte. Depois de muita farra, alegria, choro e um filho. Outros mais viriam. Seguidos de muita farra, alegria e choro. Fracassos também. Razões da minha solidão.

Por isso os fracassos se foram. Com eles a vulgaridade. Os desejos diminuíram. Teria sido melhor se eles não tivessem sido tantos. Se tivessem sido maiores que as ilusões. Ou se os desejos fossem outros. Havendo mais sonhos. Hoje vejo que meu sucesso foi não ter arrependimentos.

Um dia terei mais sonhos. A vida me mostrou isso. Ambições. Não como os de Laerte. Ele não aparece. Apenas seu dinheiro. Jorge instrui meus filhos no surf. Mas ele não me vê. Está preocupado demais em fazer o que julga ser correto.


Márcio Sclinder


*
Esta é a segunda parte da trilogia Vozes.
Episódio 1 - O jogo
Episódio 3 - Desejos

sábado, 20 de setembro de 2008

Boa dose de ilusão





Gosto muito de rever filmes. Por diversos motivos, principalmente depois que passa um bom tempo. Minha escolha de ontem foi por querer assistir um filme de mistério e de suspense, mas nenhuma das opções das prateleiras da locadora chamou minha atenção. Mesmo tendo diante de mim dezenas de ótimos filmes, entre eles muitos que ainda nem vi. Como num passe de mágica, lembrei que eu havia gravado de um canal de televisão um filme do tipo que estava procurando e ainda não tinha assistido. Aliás, não tinha assistido uma outra vez, pois a primeira foi no cinema e saí da sala com aquela sensação gostosa, maravilhado. É gostoso quando isso acontece - valoriza o tempo e o dinheiro gasto com a diversão. Felizmente, talvez por fazer as escolhas certas (mesmo no escuro), isso acontece comigo na grande maioria das vezes.

Foi assim com O Ilusionista, do diretor Neil Burger. Logo no início percebemos a proposta de nostalgia do diretor. É possível reparar nos enquadramentos utilizados nos filmes muito antigos, como no cinema mudo, por exemplo. Os cantos da tela levemente escurecidos, nos remetendo ao passado do cinema. Bem sacado. O roteiro nos leva a uma trama cheia de imaginação e mistério. Burger optou por dividir o filme em duas partes, sendo que na primeira a trama é contada em flashback e narrada pelo personagem de Paul Giamatti (ótimo), um chefe de polícia, o inspetor Uhl, que fica intensamente deslumbrado pelos "truques" do ilusionista Eisenheim, interpretado pelo Edward Norton (ótimo também).

O inspetor nos leva através do tempo. Vemos um garoto humilde se apaixonar pela magia, após encontrar um velhinho mágico numa estrada. Logo depois acompanhamos o garoto crescer e encantar uma garota com suas mágicas, desenvolvendo uma forte amizade. O problema é que ela pertence à nobreza e, obviamente, são proibidos de se verem. Para resumir e não tirar a curiosidade de assistir, claro que o garoto cresce, se torna famoso e volta a ver Sophie, a sua amiguinha (agora interpretada pela belíssima Jessica Biel, surpreendentemente bem no papel). Só que ela é a noiva de um poderoso integrante da realeza, um cético disposto a desmascarar Eisenheim. Não só não consegue como também acaba sendo humilhado pelo mágico. É nesse ponto que começa toda a genialidade do roteiro - é a partir desse conflito que todo o resto da trama se desenvolve, estrategicamente elaborada. E é aqui que devo parar de contar, para não tirar a diversão e a expectativa de quem ainda não assistiu.

Se você é um cinéfilo ou não, procure prestar atenção na estética do filme, na edição em fade naquele formato de bola, bem nostálgico. Como o enredo é de prender, as técnicas utilizadas na direção, assim como na edição, na iluminação e na fotografia, poderão passar despercebidas - eis um dos motivos pra se rever um filmão desse.

Foi revendo que atentei, com atraso, para o criador da trilha sonora: Philip Glass. Com perfeição ele faz com que a narrativa do filme tenha seus ápices de dramaticidade, no instante e no tempo certo, assim como nos envolve nos momentos de suspense.

Assim é a magia do cinema, com suas técnicas faz a gente viajar e ficar no limite entre a realidade e a fantasia. E nesse filme não é diferente, na verdade, abusa disso. Tudo parece ter credibilidade, mesmo o ilusionismo, mesmo com um roteiro recheado de muita licença poética. Não há exageros inacreditáveis, apenas talento e brilhantismo. Simplesmente mágico. Sem ser ilusório.


terça-feira, 16 de setembro de 2008

Diário da Morte




DIÁRIO DA MORTE: 1942


Foi um ano para ficar na história, como 79 ou 1346, para citar apenas alguns. Esqueça a foice, diabos, eu precisava era de uma vassoura ou um rodo. E precisava de umas férias.

- UMA VERDADEZINHA -
Eu não carrego gadanha nem foice.
Só uso um manto preto com capuz quando faz frio.
E não tenho aquelas feições de caveira que vocês
parecem gostar de me atribuir à distância.
Quer saber a minha verdadeira aparência?
Eu ajudo. Procure um espelho enquanto eu continuo.

Na verdade, sinto-me muito complacente comigo mesma neste momento, a lhe contar tudo a respeito de mim, mim, mim. Minhas viagens, o que eu vi em '42. Por outro lado, você é um ser humano - deve entender dessa obsessão consigo mesmo. A questão é que há uma razão para eu explicar o que vi naquela época. Muito daquilo teria repercussões para Liesel Maminger. Fez a guerra chegar mais perto da Rua Himmel, e me arrastou de carona.

Certamente houve muitas rondas a fazer naquele ano, da Polônia à Rússia à África, ida e volta. Talvez você argumente que eu faço a ronda em qualquer ano, mas às vezes a raça humana gosta de acelerar um pouquinho as coisas. Aumenta a produção de corpos e das almas que escapam. Umas tantas bombas costumam resolver a questão. Ou umas câmaras de gás, ou a conversinha de canhões distantes. Quando nada disso conclui os procedimentos, pelo menos despoja as pessoas de seus meios de subsistência, e passo a ver gente sem teto por toda parte. É comum eles virem atrás de mim quando vago pelas ruas das cidades violentadas. Imploram que eu os leve, sem perceber que já estou atarefada demais. "A sua hora chegará", eu os convenço, e procuro não olhar para trás. Vez por outra, gostaria de dizer algo como "Não vê que já estou com as mãos cheias?", mas nunca o faço. Reclamo internacionalmente enquanto vou fazendo meu trabalho, e há anos em que as almas e os corpos não se somam, multiplicam-se.

- CHAMADA ABREVIADA DE 1942 -
1. Os judeus desesperados - seus espíritos no meu colo,
ao nos sentarmos no telhado, junto às chaminés fumegantes.
2. Os soldados russos - que só carregam pequenas quantidades
de munição, contando com os tombados para arranjar o resto.
3. Os corpos encharcados de um litoral francês
- encalhados nos seixos e na areia.


* * *
Eu poderia prosseguir, mas resolvi que, por ora, esses três exemplos bastam. Três exemplos, que mais não seja, deixarão em sua boca o gosto de cinza que definiu minha existência durante aquele ano.

Muitos seres humanos.
Muitas cores.

São disparadores dentro de mim. Torturam minha memória. Vejo-os em suas pilhas altas, todos trepados uns por cima dos outros. O ar parece feito de plástico, um horizonte como cola poente. Existem céus fabricados pelas pessoas, perfurados e vazantes, e há nuvens macias, cor de carvão, que pulsam como corações negros.
E depois.
Vem a morte.
Abrindo caminho por aquilo tudo.
Na superfície, imperturbável, resoluta.
Por baixo, abatida, desatada, desfeita.

Com toda franqueza (e sei que agora estou reclamando demais), eu ainda estava me refazendo de Stalin, na Rússia. Da chamada segunda revolução - o assassinato de seu próprio povo.
E então veio Hitler.
Dizem que a guerra é a melhor amiga da morte, mas devo oferecer-lhe um ponto de vista diferente a esse respeito. Para mim, a guerra é como aquele novo chefe que espera o impossível. Olha por cima do ombro da gente e repete sem parar a mesma coisa: "Apronte logo isso, apronte logo isso." E aí a gente aumenta o trabalho. Faz o que tem que ser feito. Mas o chefe não agradece. Pede mais.

Muitas vezes, tento lembrar-me dos retalhos de beleza que também vi naqueles tempos. Revolvo minha biblioteca de histórias.
Na verdade, estou pegando uma agora.
Creio que você já sabe metade dela e, se vier comigo, eu lhe mostro o resto. Mostro-lhe a segunda metade de uma menina que roubava livros.
Sem saber, ela aguarda inúmeras coisas a que aludi há pouco, mas também espera por você.
Está carregando neve para um porão, imagine só.
Punhados de neve congelada são capazes de fazer quase qualquer um sorrir, mas não nos podem fazer esquecer.
Lá vem ela.

* * * * *


Uma pequena degustação do livro que estou lendo: A Menina que Roubava Livros, de Markus Zusak. Quem aprecia uma boa leitura, e ainda não leu este livro, deve ter ficado com água na boca.

quarta-feira, 10 de setembro de 2008

Clocks - Coldplay



Relógios

As luzes se apagam e eu não posso ser salvo
Ondas contra as quais eu tentei nadar
Me jogaram ao chão, deixando-me de joelhos
Oh, eu imploro, eu imploro e suplico - cantando
Revele coisas não ditas
Atire em uma maçã em cima de minha cabeça - e um
Problema que não pode ser comentado
Um tigre está esperando para ser domado - cantando

Você é
Você é

Confusão que não acaba
Paredes que se fecham e relógios fazendo tique-taque – eu vou
Voltar e te levar para casa
Eu não poderia parar agora que você sabe - cantando
Apareça sobre meus mares,
Malditas oportunidades perdidas – eu sou
Uma parte da cura
Ou sou uma parte da doença? - cantando

Você é, você é
Você é, você é

E nada se compara
Oh, nada se compara
E nada se compara

Lar, lar onde eu queria ir
Lar, lar onde eu queria ir
Lar, lar onde eu queria ir
Lar, lar onde eu queria ir

* * *
Preciso comentar alguma coisa? Por enquanto, nada. Quanto a você, algumas sugestões: clicar no vídeo abaixo, matar a saudade, curtir, relaxar e se deixar levar...
E se quiser acompanhar em inglês:

Clocks - Coldplay

The lights go out and I can't be saved
Tides that I tried to swim against
Have brought me down upon my knees
Oh I beg, I beg and I plead - singing
Come out of the things unsaid
Shoot an apple off my head - and a

Trouble that can't be named
A tiger's waiting to be tamed - singing


You are
You are


Confusion that never stops
Closing walls and ticking clocks - gonna
Come back and take you home
I could not stop, that you now know - singing
Come out upon my seas
Cursed missed opportunities - am I

A part of the cure
Or am I part of the disease? - singing


You are, you are
You are, you are
You are, you are
You are, you are


And nothing else compares
Oh! nothing else compares
And nothing else compares


You are, you are
You are, you are

Home, home where I wanted to go
Home, home where I wanted to go
Home, home where I wanted to go (You are)
Home, home where I wanted to go (You are)



sábado, 6 de setembro de 2008

O jogo




Eu queria ter me tornado um jogador de futebol. Laerte também. Por isso, durante nossa pequena infância, participamos de todas as “peneiras” que os “olheiros” promoviam. Mas nunca nos destacamos. No máximo eu fui escolhido para continuar num "rachão" por mais tempo que os demais concorrentes. Acho que o olheiro queria tirar a última seqüela de dúvida. No final, fui dispensado. Laerte me aguardava à beira do campo, ansioso e torcendo por mim. Voltamos para nossas casas, mais uma vez decepcionadamente esperançosos.

Até que novas atividades, outros interesses de moleque, tomaram conta de nós. Mas antes disso, em um dos meus aniversários, ganhei um jogo de tabuleiro. Banco Imobiliário. Meu tio me ensinou a jogar, dedicando desastrosos minutos me mostrando as cartas, o dinheiro farto e falso, e o objetivo do jogo. Meu interesse pelo jogo foi grande, tanto que o deixei esparramado sobre o sofá, ao lado do meu dorminhoco avô. Preferi brincar de esconde-esconde por causa da Eliana, a menina mais bela do meu prédio. Eu só me escondia ao lado dela, para ficar juntinho e poder sentir o cheiro agradável do seu creme de cabelo. Eu não sabia disso. Nem de outras coisas. Apenas que era dois anos mais velha. Que ela era precoce, eu também não sabia. Ela não reclamava por eu querer ficar sempre perto dela nas brincadeiras. Sorria. Eu devolvia. Só devolvia. Silenciosamente.

No fim da festa do meu aniversário, a idéia de brincar de Banco Imobiliário foi dela. Assim que ela juntou algumas posses, o maior objetivo do jogo, disse, toda sorridente, que já podia casar. Alguém gritou do outro lado que quem tinha de ter posses para poder casar era o homem.

Laerte ficou maravilhado com o jogo. Tanto que queria sempre brincar. Durante semanas. Insistiu. Eu não. Não vislumbrando a possibilidade de ganhar um jogo igual, perguntou se eu não toparia trocar com ele. Dependia. No seu aniversário, não ganhou o jogo que pediu. Ganhou duas bolas de capotão. Uma ficou sendo minha. O Banco Imobiliário, dele.

Aqueles outros interesses, os de moleque, logo se foram. Minha bola de futebol, a única que tive em toda minha vida, o tempo a desgastou. As lembranças dela, também. De vôlei, fiz coleções. Assim como coleciono mudanças - de opinião, de desejos, de ambições. Achei mais fácil ser professor de educação física e instrutor de surf.

Um dia ensinarei os filhos que terei. Eliana teve três. Nunca se casou. Com Laerte teve o primeiro. Mas ele não o vê. Está preocupado demais em ganhar dinheiro com seus empreendimentos.


Márcio Sclinder


*
Esta é a primeira parte da trilogia Vozes.
Episódio 2 - Razões
Episódio 3 - Desejos


* * * 
[ilustração: Andaime, de German Lorca]

quarta-feira, 3 de setembro de 2008

O auto-retrato


No retrato que me faço
- traço a traço -
às vezes me pinto nuvem,
às vezes me pinto árvore...
às vezes me pinto coisas
de que nem há mais lembrança...
ou coisas que não existem
mas que um dia existirão...
e, desta lida, em que busco
- pouco a pouco -
minha eterna semelhança,
no final, que restará?
Um desenho de criança...
Corrigido por um louco!

Mário Quintana

quarta-feira, 20 de agosto de 2008

Mais castelos de areia


E por falar em castelos de areia...


Castelos de areia

Vários
Cada um maior e mais bonito que o outro
Horas de dedicação ao vento, ao sol e ondas desalmadas
Com cinismos de vai-e-vem
O esmero o fez chegar ao ponto da dedicação total
E ininterrupta
Energia descontrolada
A jogar-se em ondas
Sobre o trabalho que se queria perfeito.
Um a um enfileirados,
Bonitos
Belamente esnobes.
Bandeirinhas coloridas sobre as torres
Onde supostamente debruçam donzelas apaixonadas
Ou sobre as quais voam bruxas de vestes negras.
A envolvê-los, a grama molhada dos sargaços
Colhidos a título de verossimilhança,
Fruto da exigência do artífice.
E vejam vocês:
Em plena praia tropical
Jaz na areia um castelo medieval,
Um logro tão grande quanto sua óbvia insensatez.
Veste-se com muito mito e aparência estrangeiros,
Tão mentirosos quanto fugazes,
Permitindo-se à ousadia
De encher de alegria
O coração de um pobre diabo.
Mas o tempo passou e a maré subiu.

Paula Dórica

domingo, 17 de agosto de 2008

A Lua


Estava navegando por aqui, respondendo algumas mensagens, acrescentando os novos comentários, quando a Giulia me chamou. Ela me aguardava na sacada, toda sorridente:

"Já viu a lua hoje? Ela está linda!"


Respondi que não e fiquei maravilhado, tanto pela beleza da lua cheia, resplandecente, brilhante, exuberante; outro tanto, muito mais na verdade, pelo fato da minha princesa querer que eu compartilhasse esse momento com ela. Minha filha querer compartilhar comigo, desconhecendo o tanto que eu gosto, foi surpreendente e muito gratificante. Ficamos por um bom e gostoso tempo lá, juntinhos, apreciando, contemplando, divagando sobre sua beleza, extasiados.

Que ela mantenha eternamente essa sensibilidade, essa percepção por tudo de belo e maravilhoso que a Natureza nos oferece; por tudo que é digno de ser visto, apreciado.

Sempre tive uma certa ligação com a lua, como que se dela emanasse uma força, um poder mágico, uma vibração, um certo magnetismo, exercendo um fascínio indescritível, como se exigisse ser adorada, contemplada. De alguma maneira me influencia, não posso negar. Nem sei explicar direito, é mais como se um outro ser me enfeitiçasse e serenamente me conduzisse, de forma a sentir a sensação de ser absorvido pelo que não existe. É algo mais do meu próprio interior, do meu íntimo mais oculto.

E assim vai me levando para caminhos dentro de mim, ora para me conhecer, me descobrir, ora para lembrar quem e o que eu sou, distanciando-me dos problemas, refletindo pontualmente nas aspirações que verdadeiramente me movem.

Místico ou não, esotérico ou não, tiro proveito de tudo, respeitando esse poder como se respeitasse uma Deusa da Lua. Uma deusa que não reina apenas dentro do meu universo. Depende de você.



Márcio Luiz Soares

sábado, 16 de agosto de 2008

Madonna surpreendente




A cantora mais famosa e mais rica completou hoje cinquenta anos! Há dois ou três anos, ela estava mais uma vez no topo das paradas com o álbum Confessions on a Dance Floor e com um megashow considerado o melhor de todos os tempos do mundo da música: a turnê Confessions Tour (vale a pena adquirir o dvd - eu não me canso de assistir!) E lá está ela novamente, após o lançamento do seu 11º álbum, Hard Candy.

Não sei o que mais admiro nela, se é o fato de estar sempre me surpreendendo (só eu?!), se é sua capacidade de se reinventar, sua irreverência, sua personalidade forte, suas atitudes (ora questionáveis, ora exemplares), seu apetite pelo sucesso ou seu talento para sempre estar em evidência.

Acompanho sua carreira desde 1982 e a princípio julguei mal como seria sua carreira, achei que apenas iria, por um breve período, ditar moda e incitar a rebeldia. Relativamente, até que durou pouco mesmo, bem diferente do que se tornaria ao longo dos anos a rainha do pop, da dance music. Sempre gostei de ver que quanto mais ela se transformava numa celebridade a frente do seu tempo, mais gerava polêmica, com seu comportamento, com suas músicas, suas apresentações e seus clipes.

Ah! Os clipes! Nunca mais foram os mesmos depois dela (e do Michael Jackson, claro). Há muito tempo seus clipes se tornaram um diferencial representativo em sua carreira por serem envolventes, marcantes, alguns polêmicos e outros que apenas fazem o que os clipes de qualidade conseguem: alimentam os olhos.

Artista determinada, consciente de sua fama, e que sabe lidar com a mídia utilizando a mesma para se projetar, catapultou sua carreira com suas jogadas de marketing ao querer chocar para que todos sempre falassem dela, comprando seus álbuns e indo a seus shows. Ou seja, enriquecendo.

Ela merece esse sucesso todo e nós, fãs, merecemos ficar babando e reverenciando suas atitudes e balançando o esqueleto, seja numa balada, na sala de casa ou dentro do carro - como vou fazer logo mais com recente sucesso, Give it 2 Me.

Seria interessante escrever mais sobre tudo o que penso e sei sobre a Madonna, mas receio que poderia soar redundante além de se tornar perigosamente enfadonho.



Espero que ela continue firme no seu posto de rainha do pop por um bom tempo, nem que seja durante o mesmo tempo que durar o meu interesse ou o meu ávido desejo por tudo que é surpreendentemente Madonna.

sexta-feira, 15 de agosto de 2008

Círculo Vicioso


Estive a pensar sobre nós mulheres e constatei algo que acredito não ser novidade para os homens. Segundo eles, somos seres estranhos. E o pior é que realmente somos.

Sempre achei que eles eram os grandes culpados pela excessiva vaidade feminina. Engano! Sábado estive numa festa e foi lá que cheguei a essa conclusão, observando o comportamento de algumas de nós. Na verdade, comecei a fazê-lo há algum tempo, mas esse dia foi crucial para que minhas dúvidas se dissipassem.

Percebi que as mulheres não gastam horas do seu dia pensando no que vestir, em que acessório ou perfume usar simplesmente para agradar o marido ou namorado, ou quem sabe, chamar a atenção de alguém especial. Não, isso seria simples demais. Não é dessa forma que funciona a cabeça da maior parte das mulheres. Elas se "vestem para matar", não para atrair os olhares masculinos e sim para "matar" de inveja todas as outras. Isso mesmo. A festa não teria a menor graça se todas as "amigas" não se voltassem para olhar a entrada triunfal. Só isso faz valer a pena todo o tempo gasto diante do espelho e as intermináveis horas pensando no que usar. Como pode? Os homens são tão menos complicados. Eles simplesmente põem-se diante do armário, escolhem uma camisa adequada para a ocasião e pronto. Jamais pensariam em ser admirados pelos amigos só pelo que estão vestindo. Nunca gastariam horas do seu tempo imaginando a raiva que aquele "amigo" sentiria ao vê-lo tão elegante! Seria até engraçado ouvir um homem dizendo que arrasou na festa com sua linda camisa nova! Ou que todos os homens morreram de inveja da sua calça bem transada. Não, o que os faz vibrar de verdade é saber no dia seguinte que todos os outros teriam dado tudo só para ter aquela bela e invejada mulher ao seu lado.

Tão diferentes e tão iguais. Mulheres, homens, todos vivendo num grande círculo vicioso, na busca incessante por elogios e galanteios. Não podemos negar que isso tudo faz bem ao ego e também a alma, mas convenhamos que chegam a ser patéticas certas situações. Se essas pessoas dedicassem uma pequena parcela do seu tempo ao que realmente importa, sem dúvida seriam bem mais felizes e viveriam num mundo bem melhor.


Kátia Martins

quarta-feira, 13 de agosto de 2008

Reconstruindo nossos castelos




Acredito que todos nós temos uma música, não digo favorita, mas uma que nos faz lembrar de uma pessoa ou momentos especiais. Não é sobre música que quero falar, sobre este assunto o Márcio discorreu muito bem e representou melhor ainda com a música do Tears For Fears.

Sou amante de todo tipo de leitura, romances, poemas, provérbios, até aquelas frases de pára-choques de caminhão estão valendo pelo bom humor e irreverência que transmitem, e por aí vai... Sendo bom, vale tudo!

Faço questão de guardar alguns textos que me marcam de certa maneira e me fazem lembrar de pessoas ou momentos importantes. Alguns felizes e outros que não gostaria de lembrar. Mas a vida não é para ser lembrada somente pelos momentos felizes (aliás, estes muitas vezes passam despercebidos) mas, principalmente por alguns que não diria "infelizes" e sim "difíceis". Afinal, são estes momentos que nos fazem crescer, evoluir como pessoas.

Ao passar por um dos momentos de dificuldade da minha vida, senão o mais difícil, me apossei de uma determinada mensagem que considero muito, pois me ajudou a enfrentar os problemas pelos quais estava passando.

Deixo aqui a mensagem para apreciarem. Espero que gostem.


Margareth Itou Pinheiro


***
Castelo de Areia

São pequenas as coisas que no ensinam muito.

Num dia de verão, eu estava na praia, espiando duas crianças na areia. Trabalhavam muito, construindo um castelo de areia molhada com torres, passarelas e passagens internas. Quando estavam perto do final do projeto, veio uma onda e destruiu tudo, reduzindo o castelo a um monte de areia e espuma.

Achei que as crianças cairiam no choro, depois de tanto esforço e cuidado, mas tive uma surpresa: em vez de chorar, correram para a praia, fugindo da água, rindo, de mãos dadas, e começaram a construir outro castelo.

Compreendi que havia recebido ali uma importante lição: tudo em nossas vidas, todas as coisas que gastam tanto de nosso tempo e de nossa energia para construir, tudo é passageiro, tudo é feito de areia; o que permanece é só o relacionamento que temos com as outras pessoas.

Mais cedo ou mais tarde, uma onda virá e destruirá ou apagará o que levamos tanto tempo para construir. E quando isso acontecer somente aquele que tiver as mãos de outro alguém para segurar, será capaz de rir e recomeçar.

(autor desconhecido)

terça-feira, 12 de agosto de 2008

O Coringa definitivo


Acho sensacional quando isso me acontece: ficar surpreso com um filme, superando minhas expectativas . Principalmente quando me faz sair do cinema sorrindo, deliciado. Isso acontece muito mais quando decido não ler muito a respeito do filme. Foi assim com Batman - O Cavaleiro das Trevas, de Christopher Nolan. Evitei ler as críticas e pouco me informei sobre sua produção enquanto rolava as filmagens. É obvio que fiz de propósito. Sabia que Chris Nolan não ia perder a mão, que a sequência não seria ruim. Batman Begins, seu filme anterior, além de ser melhor que qualquer outro filme baseado no personagem, na minha humilde opinião, é a melhor adaptação de quadrinhos para o cinema. Essa continuação, para mim, equipara-se ao filme anterior - nem inferior, nem superior.

Mais uma vez o vilão rouba a cena. A atuação de Heath Ledger está fantástica. Que Jack Nicholson que nada! Para muitos Nicholson teve uma atuação suprema - eu nunca considerei assim, apesar de ter gostado. Ledger simplesmente absorveu o Coringa dos quadrinhos (de Alan Moore e de Frank Miller) e o trouxe para a telona, do jeito que eu conhecia e apreciava, isento de qualquer caricatura e único. Para ser mais exato, o ator incorporou o personagem de uma maneira fenomenal. Pena que o ator tenha falecido tão precocemente, certamente teríamos o privilégio de ver outras grandiosas interpretações. Especula-se que vai concorrer ao Oscar. Merecido.

Para mim a melhor versão deste doido nos quadrinhos foi em A Piada Mortal, de Alan Moore. A história tem diversas tramas paralelas, cheia de simbolismo, de ótima narrativa e surpreendentemente profunda, seja no aspecto psicológico e na linguagem. De seu Coringa, aparentemente um criminoso comum, humano e lúcido, ele extraiu um homem totalmente insano e violento. Logo abaixo, bem encostadinho, na graphic novel Batman - O Cavaleiro das Trevas, temos o Coringa de Miller, a própria encarnação do mal, implacável. Aliás, para ambos autores o Coringa era o mais implacável dos inimigos de Batman, e o mais respeitado, pode-se assim dizer. Se gosta de HQ de qualidade e tendo chance, leia estas versões do Batman (assim como Batman Ano Um, também de Miller). São imperdíveis. Considero o Batman de Frank Miller um pouco superior ao de Alan Moore, e na minha opinião, foi em quem Nolan se baseou para retratar o Dark Knight nos filmes, um personagem tenso e sombrio. Bom, isso pode ser assunto para outra postagem, diretamente relacionada ao universo dos quadrinhos.

Heath Ledger, como o Coringa, roubou o filme, mas os demais atores do elenco também estão ótimos. Começando pelo Christian Bale (quem diria aquele menininho franzino e espivetado de Império do Sol), mais uma vez está muito convincente no papel - interpretando o melhor Batman de todos os tempos, onde se vê claramente toda sua preocupação existencialista, suplantando qualquer dualismo entre o bem e o mal que poderia haver dentro de si, acima de qualquer princípio. Gary Oldman, Michael Caine e Morgan Freeman, repetindo seus papéis do filme anterior, dão um charme especial. Tem também Aaron Eckhart que sempre admirei, e Maggie Gyllenhaall, que achei fabulosa no filme Mais Estranho que a Ficção, está no lugar da Katie Holmes - sei lá o motivo, mas a troca foi certeira - tirando o aspecto insosso da personagem.

Há uma aura de pessimismo no ar de Gotham que dá uma sensação de perda, de que tudo será eternamente um caos, muito bem transmitido ao espectador graças ao competente trabalho de fotografia, direção de arte, som e trilha sonora. Esse clima sombrio, degradante, imposta na cidade pelo Coringa, é que dá o tom insano, forçando, manipulando diversos personagens a romper com suas próprias verdades em prol de algo maior, motivados pelas circunstâncias e, assim, todos caem nas armadilhas do hábil vilão.

O filme é repleto de cenas mirabolantes e de enquadramentos sombrios, e eu não podia deixar de destacar umas das melhores - a do vilão pendurado por uma corda, capturado pelo Homem-Morcego. Nesta cena, um dos momentos mais significativos de toda a trama, ficamos diante de um terrível misto de lucidez e loucura dentro de uma confusa massa cinzenta de um homem que nada mais é do que um desmitificador dos valores humanos. O genial Christopher Nolan iniciou a cena com o Coringa de cabeça para baixo e, nem lento nem rápido demais, vira a câmera, em close, de maneira que não o vemos mais naquela posição, e, sim, como se estivesse virado para cima. Tal qual numa carta de baralho, onde vemos o coringa de cabeça para cima e ao contrário, simultaneamente.

Essa engenhosidade do diretor, utilizando habilmente esse artifício simbólico, é o que poderia haver de melhor para desconstruirmos o personagem, aliado, obviamente, ao que foi proferido pelo vilão naquele momento, capaz de nos levar a rever determinados conceitos. Prefiro não citá-los. Veja o filme e tire suas próprias conclusões. Levando em consideração quantas vezes você já riu de suas próprias piadas. Sozinho.